Robert Ponge
A COMUNA
O Comitê Central começa por abolir o estado de sítio na cidade, suprimir os tribunais militares, decretar a anistia geral dos delitos políticos e a imediata libertação dos presos, restabelecer a liberdade de imprensa, nomear responsáveis pelos ministérios e pelos serviços administrativos e militares essenciais. No dia 19, fixa para o dia 22 as eleições para a Comuna, depois postergadas para o dia 26, por pressão dos prefeitos.
Por sua vez, o governo de Versalhes delega, provisoriamente, a administração de Paris à assembléia dos prefeitos das regiões administrativas: junto com os deputados eleitos por Paris (para a Assembléia Nacional, em 8 de fevereiro), condenam o Comitê Central, depois tentam funcionar como mediadores junto a Versalhes, no sentido de uma volta negociada à normalidade. No dia 21 de março, a Assembléia Nacional condena o "governo faccioso" de Paris.
No dia 22, acontece, em Paris, uma pequena manifestação contra o Comitê Central; também os batalhões da Guarda Nacional dos bairros ricos colocam-se sob a direção de lideranças fiéis ao governo de Versalhes. O que leva o Comitê Central a adotar algumas medidas enérgicas, em particular, a dotar-se de uma direção militar e a tomar o controle das prefeituras das regiões administrativas.
Cabe aqui assinalar que, entre 22 e 26 de março, são também instaladas Comunas, mais ou menos fugazes, em algumas outras cidades (Lyon, Marselha, Narbonne, Toulouse, Saint-Étienne, Le Creusot).
No dia 23, o Comitê Central lança um manifesto em que define suas perspectivas:
O princípio de autoridade está doravante impotente para restabelecer a ordem na rua, para fazer renascer o trabalho nas oficinas, e esta impotência é sua negação ... A independência da Comuna é a garantia de um contrato, cujas cláusulas, livremente debatidas, porão um fim ao antagonismo das classes e assegurarão a igualdade social ... Hoje, o povo de Paris é clarividente ... Rejeitará qualquer prefeito, qualquer representante do poder central imposto por um Governo estranho a suas aspirações.13
Apesar de indecisões, pressões e contrapressões, as eleições acabam confirmadas e realizadas no dia 26 de março. A taxa de abstenção (mais de 60%) é altíssima nos bairros burgueses. Mesmo assim, votam 229.267 parisienses, o que não é nada mau. No dia 28, o Comitê Central da Guarda proclama os resultados, instala a Comuna e declara abdicar de seus poderes em prol desta. São 86 eleitos (entre os quais 25 operários); 15 de seus membros, afinados com os prefeitos, abandonam a Comuna quase imediatamente, seguidos, pouco depois, por quatro outros. Para substituí-los, serão realizadas eleições complementares em 16 de abril.
No dia 29 de março, a Comuna organiza-se em dez comissões, tendo como base de referência os ministérios até então existentes (menos o dos cultos, que é suprimido): Militar, Finanças, Justiça, Segurança, Trabalho, Subsistência, Indústria e Trocas, Serviços Públicos, Ensino ? coroadas por uma Comissão Executiva.
Nesse meio tempo, Versalhes não ficara inativo. Trouxe para a região parisiense tropas oriundas do interior; como o armistício autorizava a França a manter apenas quarenta mil soldados na região parisiense, Thiers negociou, com os alemães, a autorização para ali concentrar mais tropas, com o fim de restabelecer a ordem. Bismarck foi muito compreensivo: o acordo de 28 de março autorizou oitenta mil homens. Após outras negociações, Versalhes obterá, posteriormente, a autorização de concentrar 170 mil homens, dos quais cerca de cem mil serão prisioneiros gentilmente libertados pelos alemães para este fim específico.
No dia 30, o governo de Versalhes começa a investir contra Paris, apoderando-se do município fronteiriço de Courbevoie. Em 2 de abril, ocorre o primeiro confronto entre as tropas de Paris e as de Versalhes, com o revés dos parisienses; os prisioneiros são fuzilados pelos Versalheses. A notícia agita Paris. Cedendo à pressão popular, a Comuna decide enviar tropas contra Versalhes. Mal organizada, com ilusões de que os soldados de Versalhes não ousariam atirar contra os "federados" (a Guarda Nacional, os parisienses), a iniciativa resulta em um sério revés. Em 5 de abril, a Comuna toma a decisão de executar três reféns por cada federado executado por Versalhes (o decreto só será aplicado nos últimos dias da Comuna). A luta militar entra numa fase de guerra de bombardeios à distância, com escaramuças de vez em quando. Versalhes afirma várias vezes que não aceita qualquer pacificação ou conciliação, apenas a rendição pura e simples de Paris.
Em 19 de abril, é votada, quase por unanimidade (apenas um voto contra), uma Declaração ao Povo Francês, que apresenta o programa da Comuna e sua proposta de Constituição Comunalista, que, comentou Marx, teria "começado a regeneração da França".14
Em 21 de abril, há uma reestruturação das Comissões, que passam a ser encabeçadas por um delegado ? os nove delegados constituindo a Comissão Executiva. Como isto não basta para fortalecer e agilizar a ação da Comuna, é criado um Comitê de Salvação Pública, de cinco membros, "responsável apenas diante da Comuna" (proposta que encontrou a oposição de uma importante minoria, entre os quais os membros da AIT). O novo comitê não terá o efeito mágico esperado por seus proponentes.
A partir de 26 de abril, os federados começam a perder posições: Les Moulineaux naquele dia; as fortificações de Moulin-Saquet em 4 de maio; perda de Clamart no dia seguinte; revés de Vanves, em 6 de maio; perda das fortificações de Issy no dia 8, dia em que Thiers lança um ultimato aos parisienses.
Em 9 de maio, o Comitê de Salvação Pública sofre uma renovação, na esperança de melhorar sua ação efetiva. Por sua vez, no dia 10, o governo de Thiers assina a paz com a Alemanha em Frankfurt.
No dia 20, os versalheses entram em Paris: um traidor lhes abriu uma porta; 130 mil homens começam a penetrar na cidade. O alerta é dado; iniciativas individuais de resistência são tomadas. No dia 22, o Comitê de Salvação Pública lança um apelo geral às armas. Os bairros populares enchem-se de barricadas. Pratica-se a guerra de ruas; para dificultar o avanço do adversário, incendeiam-se os edifícios na hora de abandoná-los. Os versalheses ver-se-ão obrigados a conquistar a cidade quarteirão por quarteirão. Em 24 de maio, a Comuna abandona o Hôtel-de-ville, para instalar-se na Prefeitura da 11ª região administrativa. No dia 25, acontece a última reunião da Comuna. No dia seguinte, resiste apenas um bolsão no bairro Saint-Antoine e arredores. A última barricada, na rua Oberkampf, é tomada pelos versalheses às 13 horas do dia 28 de maio.
Um total de 877 homens das forças de Thiers morreram durante os enfrentamentos; cerca de quatro mil dos combatentes federados. Com a queda da Comuna, termina a chamada Semana Sangrenta; as cortes marciais dos versalheses não cessam, contudo, de trabalhar e as execuções sumárias duram mais outra semana. O general Mac-Mahon reconheceu oficialmente 17 mil execuções; foram no mínimo vinte, talvez 25 mil. Uns dez mil federados conseguiram fugir para o exílio. Houve ainda 43.522 presos, que foram processados judicialmente; 91 foram condenados à morte, cerca de quatro mil à deportação na Nova Zelândia, uns cinco mil a penas variadas, de prisão, etc.
Algumas questões de interpretação
Revista O Olho da História
OS DIAS DA COMUNA Bertold Brecht Considerando nossa fraqueza os senhores forjaram Suas leis, para nos escravizarem. As leis não mais serão respeitadas Considerando que não queremos mais ser escravos. Considerando que os senhores nos ameaçam Com...
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