Reformas - Grécia - Stásis - Legisladores e Tiranos
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Reformas - Grécia - Stásis - Legisladores e Tiranos


AS REFORMAS POLÍTICAS SOFRIDAS EM ATENAS: DO FINAL DO ARCÁICO AO PERÍODO CLÁSSICO

Na análise que se segue, abordaremos alguns fatores importantes que influenciaram no desenvolvimento da cidade-estado de Atenas. Analisaremos criticamente alguns fatores relevantes que, contudo, foram de suma importância para a transição da pólis aristocrática para a pólis democrática.

Abordaremos, primeiramente, as reformas políticas sofridas do final do período Arcaico (por volta do século VI a.C.) até o período Clássico e posteriormente as conseqüências sociais, políticas e econômicas que se deveram a este fato.

No final do Período Arcaico, em pleno regime aristocrático (onde era os “melhores” detêm o poder), Atenas estava em crescente expansão política e social. Por um lado, a aristocracia “reinava” e por outro a população reivindicavam seus direitos perante a pólis. A população da Ática crescia demasiadamente por fatores políticos e econômicos, mas ainda eram os eupátridas que detinham o maior número de terras.

Os camponeses pobres ainda lutavam por seus direitos a terra, o que gerou uma crise agrária que agravaria um conflito entre este grupo social e os aristocratas.

Com esse crescimento demográfico em Atenas, medidas importantes foram tomadas: fora necessário que fossem colonizadas novas áreas fora de Atenas, principalmente pelo Mediterrâneo, para que essas áreas pudessem comportar os “novos habitantes” e, de certa forma, intensificar o comércio com a pólis de origem. Platão, (Leis, 735e-736a) via nos homens desprovidos de recursos um perigo, já que ambicionavam os bens dos ricos, e na colonização uma expulsão benigna, para que a pólis deles se desembaraçasse.

A esse conjunto de transformações e reformas políticas e sociais, daremos o nome de Stásis.

Nestas expedições, houve algumas conseqüências que, por sua vez, modificaram o cenário econômico e político de Atenas. O comércio entre essas novas colônias e a pólis de origem foi a cada dia se intensificando mais. Começava-se então uma expansão da economia mercantil por estas áreas. Diante de tal situação, novos portos e mercados foram abertos para que se aproximassem ainda mais o comércio entre tais regiões. Com isso, foi implantado um sistema monetário, que visava, por exemplo, facilitar o pagamento de impostos e multas exigidos pelas cidades-estados. Segundo o historiador Ciro Flamarion Cardoso (1993, p.24) o surgimento da moeda (inventada no Reino da Lídia, no século VII a.C.) deve-se a fatores extra-econômicos, como por exemplo: proclamar a soberania das póleis, facilitar o pagamento de impostos e multas exigidos pelas cidades-estado, financiar tropas mercenárias, etc.

Os novos comerciantes, que foram juntamente com essas expedições para fora da Ática, acumularam fortunas e se tornaram novos ricos, se juntando à velha aristocracia. Novos padrões de riquezas foram formados: o mobiliário, que veio a se juntar ao padrão imobiliário.

Cardoso acredita que o principal objetivo dos gregos com essas expedições feitas pelo Mediterrâneo foi o de buscarem novas terras cultiváveis, visando assim uma multiplicação e fortificação da pólis de origem. Nesse processo de colonização, o número chegaria a aproximadamente 1500 a 2000 colônias. Houve, ainda assim, algumas colônias que fundaram novas colônias.

Com todas essas mudanças em Atenas, a população continuava insatisfeita. Os pobres queriam a abolição da escravidão e servidão por dívidas. Os enriquecidos não pertencentes à aristocracia queriam a fixação das leis por escrito e de certos direitos políticos.

Com a expansão da pólis, devido à crise agrária e a conseqüente fundação de novas colônias e cidades, foi-se necessário efetuar um recrutamento maior de combatentes militares.

Atenas aumentava a todo o momento seus contatos com as novas colônias. Com isso, qualquer pessoa que tivesse condições de se armar poderia ser um hoplíta (militar). Antes disso, somente os eupátridas poderiam compor o exército dos holplítas. Mas, com essa “brecha” que se abriram, os novos hoplítas começaram então a reivindicar seus direitos políticos.

Com estas séries de manifestações feitas pela população, os aristocratas se sentiram ameaçados e passaram a serem pressionados pelas classes mais baixas para fazerem concessões políticas que lhes permitissem diretos perante à pólis. Dessa forma, as classes dominantes foram obrigadas a cederem modificações, para amenizarem os problemas.

Na medida em que os problemas das classes populares e inferiores não eram solucionados com tais reformas, abriam-se possibilidades para que outros regimes políticos fossem implantados para tentar resolver tais interesses da população

Durante o Período Arcaico, em Atenas, os legisladores e os tiranos foram governantes de suma importância para a implantação da democracia ateniense. Foram eles os principais responsáveis pelas novas reformas políticas que abrangeram todas as classes sociais, desde a classe dominante (Eupátridas; Aristocratas) até as classes populares, deixando essa última com maiores “concessões” perante a pólis ateniense.

Os legisladores não se limitaram a fixar somente por escrito o direito aristocrático. Eles agiram também como mediadores das facções em conflito. Eram vitalícios, mas em certos casos tinham tempo limitado no poder. Gozavam de poderes extensos, tanto legislativos como executivos.

Em 621 a.C., Drácon, um legislador que compunha o Areópago (Conselho Aristocrático; Magistrados), introduziu reformas políticas bastante rigorosas para a época. Ele foi o responsável pela criação das leis escritas de domínio público, e não mais segundo às arbitrariedades dos aristocratas através da oralidade. Drácon também foi o responsável pela admissão de todos os hoplítas – inclusive os de origem não nobre – à cidadania. Eles poderiam eleger os arcontes, mas não poderiam compor o Areópago.

Ainda assim, Drácon manteve os privilégios da aristocracia. Os escravos e os camponeses pobres não foram favorecidos, permanecendo assim a escravidão por dívidas. Estes camponeses pobres, ao se endividarem com os ricos, tornavam-se clientes e arrendatários dos mesmos, pagando certa quantia da colheita (entre um sexto e cinco sextos) como aluguel da terra que haviam perdido. Permanecendo esta dívida, estes camponeses podiam, com sua família, serem vendidos como escravos para fora da Ática (já que em Atenas os escravos eram exclusivamente estrangeiros), ou nesta trabalhar como servos de seus credores.

Segundo a historiadora Natália Araújo, diante das reformas de Drácon: “o objetivo de suas leis foi o de disciplinar a distinção de comportamentos entre a massa de populares e os cidadãos da elite” (2003, p. 244).

Drácon preservou a hegemonia econômica dos aristocratas, mas ainda assim as terras estavam concentradas em poucas mãos. Tal situação levou a “que os nobres e a multidão entrassem em conflito durante longo tempo” (ARISTÓTELES, Constituição de Atenas, II, 1 e V,1).

Em 591 a.C., Sólon foi eleito arconte com plenos poderes para proceder as reformas sociais e políticas na pólis. Segundo Natália Araújo, “é Sólon quem pode ser considerado o idealizador do sistema democrático de governo” (2003, p. 244).

Ao contrário do que se esperava Sólon não efetuou a re-divisão das terras reclamadas pelos populares. Mas, em contrapartida, foi ele o responsável pela abolição da escravidão por dívidas. No que diz respeito ao assunto, Ciro Flamarion Cardoso diz o seguinte:

Ao que parece, os pequenos proprietários que haviam perdido suas terras voltaram à plena propriedade destas; os que haviam sido vendidos como escravos no exterior foram, na medida do possível, comprados aos deus donos pelo Estado ateniense e alforriados. (CARDOSO, 1993, p.43).

Sólon também foi o responsável por introduzir um sistema censitário, dividindo em quatro classes os cidadãos atenienses segundo o rendimento agrícola que dispunham. Com isso, a participação política foi ampliada também para os que continham uma riqueza econômica não só imobiliária ou hereditária, mas também pelo poderio econômico mobiliário.

Foram assim divididos: PENTACOSIOMÉDIMNOI (aqueles que tinham a renda da terra em 500 medidas ou mais; proprietários de terras) poderiam ter acesso ao Arcontado; HIPPEIS (cavaleiros que tinham condição de se manter um cavalo e servir na cavalaria); ZEUGITAS (guerreiros de infantaria que tinham condições de comprar escudo e lança); e os TETES (camponeses e artesão que poderiam participar da assembléia popular, Eclésia).

À Sólon também podemos atribuir à criação da Boulé, um segundo conselho composto de quatrocentos membros sorteados da Assembléia (Eclésia), paralelo ao Areópago. Cada membro da Boulé tinha um mandado específico, de apenas um ano.

Contudo, as reformas de Sólon não agradaram a todos. Os camponeses ainda reivindicavam a reforma agrária. Os aristocratas, que perderam suas terras para os que voltaram da escravidão por dívidas, ficaram irritados com tais atitudes tomadas por Sólon. Para Ciro Cardoso, “as reformas de Sólon só apaziguaram por pouco tempo a luta social ou stásis” (1993, p. 44).

Depois de várias décadas de conflitos, Psístrato (560-527 a. C.), chefe aristocrático da facção popular, tomou o poder como tirano. Sobre tirania, Ciro Cardoso afirma o seguinte:

Magistrados eleitos que pela força se mantiveram no cargo ao expirar o seu mandato [...] governo de tipo pessoal e ilegal do ponto de vista dos aristocratas, embora ele mantivesse o aparelho tradicional dos órgãos da pólis; sua legitimidade e sua base social vinham do fato de proteger os populares contra a classe dominante; o tirano era um nobre, ou parcialmente descendente de nobres. (CARDOSO, 1993:31).

Psístrato tomou várias medidas importantes para que pudesse favorecer a classe popular perante à classe dominante. Uma delas foi desarmar a população.

Alguns aristocratas foram exilados, outros mortos e suas terras confiscadas e divididas entre camponeses pobres. Ele incentivou a colonização ateniense pela Trácia, instituiu juízes itinerantes no meio rural da Ática e criou um sistema de empréstimo aos pequenos cultivadores. Realizou obras públicas, o que gerou empregos aos pobres. Também incentivou a cultura, encomendando a transcrição da Ilíada e da Odisséia, antes conhecidas apenas oralmente.

Com todas essas reformas, desde as de Sólon, os eupátridas se sentiram prejudicados e, com isso, acabaram se aliando aos aristocratas de Esparta e invadiram Atenas. De certa forma, foram contidos e continuaram insatisfeitos com os regimes adotados pelos tiranos.

Psístrato, ao morrer, foi substituído por seus filhos Hipias e Hiparco, que continuaram o mesmo regime do pai. Em seu governo autoritário, Hipias foi, por fim, derrubado pelos genos, como apoio dos hoplítas espartanos.

Em 508 a. C., dois anos após a queda da tirania, Clístenes conseguiu com forte apoio popular, impor reformas que inauguraram o regime democrático. Ele reinstala a Boulé (que teve seu número expandido para 500 membros, 50 por tribo; poderia controlar o arcontado e preparar projetos para serem votados pela Eclésia) e a Eclésia (quem estivesse alistado no demos poderia compor a Eclésia através de sorteios, com exceção dos metecos), acrescentando alguns aprimoramentos.

Ele foi o responsável pela divisão dos cidadão em 10 tribos, e não mais em quatro exclusivamente de origens jônicas. Incorporaram os metecos (estrangeiros) e os libertos. A sociedade assim se dividia: Cidadãos (homens nascidos em Atenas, maiores de 18 anos e de pais atenienses); metecos (estrangeiros que se dedicavam ao comércio e não tinham direitos políticos); e os escravos (comprados e conquistados em guerras; não tinham direitos, assim como também não tinham direitos políticos as mulheres).

Clístenes também criou uma nova magistratura eletiva, paralela aos Arcontes, constituída por dez Estrategos ou generais, que poderiam ser reelegíveis indefinidamente. De início eram eleitos pela Eclésia à razão de um por tribo, depois sem tal limitação. Eles se tornaram os magistrados mais importantes. Deveriam ser casados legitimamente e proprietários rurais na Ática. Sua função não era remunerada.

Por fim, Clístenes também implantou a pena de ostracismo, que expulsava e cassava os direitos políticos de certo cidadão por 10 anos devido à presença dele ser considerada uma ameaça para a pólis. Quanto a essa questão, Ciro Cardoso argumenta:

O condenado poderia receber no estrangeiro a renda proveniente de seus bens e, ao voltar a Atenas, - passados dez anos ou sendo chamado antes por decisão popular -, recuperava automaticamente os plenos direitos de cidadão. A medida era encarada como recurso contra a ameaça de uma volta à tirania. (CARDOSO, 1993, p.46).

Com todas essas reformas, a aristocracia conservadora se sentia ainda mais prejudicada e voltou a aliar-se a Esparta, invadindo Atenas novamente. Todavia foram contidos e continuaram revoltados com tal sistema político.

Ao término do período Arcaico e conseqüente início do período Clássico (séc. V a. C.), a democracia ateniense foi se completando ao longo desse período de transição. Novas medidas foram implantadas e também foram instaladas novas instituições políticas para o controle da cidadania da polis ateniense.

Com todas essas mudanças, o regime democrático foi se tornando cada vez mais legítimo pela população de Atenas.

Após esse período, Péricles (eleito Estratego pela Eclésia) destacou-se por sua liderança e suas modificações na pólis ateniense. Ele governou de 460 a 426 a.C., época que compreende a Idade de Ouro grega, datada das cinco últimas décadas do século V a. C. A ele se deve também algumas mudanças políticas que continuaram a conturbar os interesses dos aristocratas atenienses.

Durante o século V a.C, em função de graves derrotas militares, ocorreram breves tentativas de estabelecimento de governos oligárquicos. A rivalidade de Atenas com Esparta foi levada a termo na Guerra do Peloponeso e, por fim, ao final do regime democrático, sucedendo-se a dominação dos Macedônios e conseqüentemente dos Romanos.

Após quase dois milênios não se ouviria mais falar em democracia. Segundo Natália Araújo, “os romanos idealizaram e nos legaram seu não menos importante sistema nomeado res pública (coisa pública) ou República, como o conhecemos ainda hoje” (2003, p. 247).


Referências Bibliográficas:

CARDOSO, Ciro F. A Cidade-Estado antiga. 4ª Ed., São Paulo:Ática, 1993, PP. 17-56

ARAÚJO, Natália R.R. Grécia: cultura política, democracia e direito in Revista da FADIVALE, 2003, PP. 229-251





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