EGITO ANTIGO: A RAINHA HATSHEPSUT (1503-1482 a.C.)
História do Brasil e do Mundo

EGITO ANTIGO: A RAINHA HATSHEPSUT (1503-1482 a.C.)




O Egito faraônico produziu uma série de mulheres excepcionais, sendo a Rainha Hatshepsut, a mais famosa delas. Muitas mulheres de faraós tinham tido um lugar ao Sol ao lado de seus maridos e somente duas delas haviam governado por breve tempo, mas Hatsheputs foi a primeira que se arrogava a divindade e a realeza, usando Dupla Coroa, que indicava a soberania sobre as duas regiões do Alto e Baixo Egito. Há estátuas que a mostram com atributos masculinos da realeza. Em algumas, chega a usar a tradicional barba postiça dos faraós. Este faraó feminino abandonou a guerra e fez o Egito voltar a atividades pacíficas, tais como a construção de grandes monumentos e manutenção das rotas de comércio com o exterior, que tinham sido fechadas durante o domínio dos hicsos.

HATSHEPSUT, A PRIMOGÊNITA DE AMON Sabe-se que a rainha Ahmosis ta-Sherit não levou durante o reinado de seu esposo, Tutmés I, os títulos de "Herdeira e "Esposa do deus", pois parece que não tinha direito a eles. Esses títulos seriam outorgados posteriormente, quando sua filha subiu ao poder. No entanto, essa rainha deu ao rei seus filhos: Hatshepsut, Amen-Mose, Amen-Neferu-Ra, Meryt-Ra, Ajbet-Neferu, Nefery-Bity, dos quais sobreviveram só a primogênita Hatshepsut, e a menor, a princesa Neferu-Bity. O rei Tutmés I, entretanto, havia tido com uma esposa secundária chamada Mut-Nefer, um robusto menino, a quem foi chamado de Tutmés, ele seria o futuro rei Aa-Jeper-en-Ra Tutmés II. Como já havia ocorrido na sucessão de Amen-Hotep I e, portanto, sendo essa a segunda vez, o filho de uma esposa secundária era o único varão com possibilidade de ascender ao trono do Egito. Porém tudo deveria ser feito conforme a lei, por intermédio do casamento com uma princesa real que lhe desse a legitimidade necessária para ocupá-lo.


Nesse caso, essa mulher foi Hatshepsut. Cabe colocar que era costume os faraós casarem-se com irmãs, ou outros membros da família, com o intuito de preservar a pureza da casta. Na verdade, no Egito, o matrimônio não tinha caráter sagrado e as pessoas não realizavam cerimônias especiais. O rito nupcial inexistia, mesmo para os faraós. O mais freqüente era que no dia do casamento os familiares da noiva levavam à casa do noivo os bens que formavam o dote. O que não podia faltar, entretanto, era a festa, com muita cerveja e iguarias. Á mesa do faraó tomava-se apenas vinho e os pratos de carne de hiena constituíam o manjar favorito. Mas o que existia, principalmente entre a nobreza, era a infidelidade. Mas hoje se sabe que o adultério no Egito era castigado com a morte. Somente os faraós estavam autorizados a ter quantas esposas quisessem, além de possuir um farto harém de concubinas.

 O reinado de Tutmés II durou pouco mais de três anos. Pela terceira vez, se reproduz o estabelecimento de uma sucessão ao trono sem um herdeiro varão com plena legitimidade de ascendência. Tutmés II havia falecido sem ter tido filhos varões com a "Grande Esposa Real", Hatshepsut, com a qual só havia tido filhas: as princesas Neferu-Ra e Meryt-Ra. No entanto, o rei morto havia gerado com uma mulher chamada Ísis um filho de nome Tutmés, que seria o futuro Tutmés III (1488-1434 a.C.). Essa mulher, nem sequer tinha a condição de "Esposa Real". Dessa maneira, o varão para ocupar o trono, só poderia fazê-lo casando-lhe com uma princesa de estirpe legítima direta, mas a criança tinha naquele momento não mais de cinco ou seis anos. A única opção que restou, foi casar o príncipe menino com algumas das duas também meninas princesas, filhas de Tutmés II e a rainha Hatshepst, e se estabelecer uma espécie de regência com a rainha mãe até que o novo soberano pudesse atuar por si mesmo.


O GOLPE DE ESTADO DE HATSHEPSUT Hatshepsut era uma mulher de caráter extraordinário. Parece ter tido tanta força política quanto carisma, além de saber controlar habilmente o Clero de Amon, sendo assim, num dado momento, conseguiu usurpar o trono de Tutmés III e se tornar, com direito a todas as honras, o Faraó do Egito. Ao contrário do que viria a ocorrer no Período Ptolomaico; as mulheres não podiam ocupar o cargo de Faraó. Não eram nem sequer Rainhas, eram, no máximo, a esposas do Rei. Por isso, a ascensão ao trono de Hatshepsut foi um fenômeno tão importante dentro do contexto político nacional. Ao que parece, Hatshepsut conseguiu convencer o Clero de Amon a ver nela a verdadeira encarnação de Amon-Ra e, sendo assim, a herdeira do trono. Ela tomou para si o cajado, o mangual, as coroas e até mesmo a barba Reais tornando-se o novo Faraó. Esse "golpe de Estado", tinha em suas previsões o estabelecimento de um verdadeiro sistema sucessória de linhagem feminina, cuja implantação supunha um avanço a más de domínio da mulher nas estruturas políticas do Egito. Sendo assim, a primogênita de Hatshepsut, estava destinada a suceder sua mãe em exercício direto e pessoal da realeza.

HATSHEPSTU E SEN-EN-MUT: UMA HISTÓRIA DE AMOR IMPOSSÍVEL Só o nome de Sen-en-Mut evoca imediatamente a rainha a quem serviu. Ambos permaneceram unidos em uma história de amor negada pelos homens e ressaltada, no entanto, pelas evidências que esse "Mordomo da Rainha" repartir por todo o Egito. Segundo todos os indícios, Sen-en-Mut e sua família procediam de "On do Sul", a atual Armant, localidade que fica atualmente a uns 20 km de Tebas. Seu pai foi o "Venerável" Ra-Mose e sua mãe foi a "Senhora da Casa", Hat-Nefer. Sua carreira começou aparentemente, no exército e em seguida na organização administrativa do tesouro real, onde alcançou os mais altos postos. Foi o Mordomo e administrador da princesa Neferu-Ra.

Entre os mais de 80 títulos que teve destacam-se os de "Mordomo Chefe" do rei, da rainha, de Neferu-Ra e do próprio deus Amon. Também foi "Chefe de todas as obras da rainha e de Amon". Desde cedo, Sen-en-Mut se distinguiu, não só pela amplitude de seu "curriculum", mas sim pelas obras realizadas sob sua direção em favor da soberana. Com certeza foi o aquiteto que desenhou e executou o templo de "Milhões de Anos" de Hatshepsut no circo de Deir-El-Bhari entre os anos 7 e 15 do seu reinado. Os obeliscos erigidos no templo de Karnak e outra sobras realizadas dentro do mesmo templo, também se construíram sob sua direção. A meteórica ascensão de Sen-en-Mut na corte coincidiu com a coroção da rainha como faraó do Egito. Esse feito, junto com o achado de um grafite inscrito no interior de uma gruta sobre o templo de Deir-El-Bahari que parece representar a rainha e seu arquiteto chefe em uma postura obscena, deram lugar a pensar que existiu entre ambos uma relação amorosa. Porém, não são só essas, as provas dos possíveis amores entre a rainha e seu arquiteto chefe. Outro grafite localizado perto de Assuán, mostra Sen-en-Mut como "O Confidente da Esposa do deus" e "O que é agradável a Senhora das Duas Terras", "O Grande Mordomo da Esposa do deus" e "O regente da totalidade das Duas Terras". Só a contemplação de tais títulos permite compreender que a relação de confiança entre a rainha e o arquiteto foi bem mais importante do que simplesmente derivada das funções de governo. Além disso, a presença de Sen-en-Mut no mesmo templo de Seir El Bahari, é algo que não deixa lugar à dúvidas. Uma das questões que mais deu o que pensar no verdadeiro papel desempenhado por Sen-en-Mut durante o reinado de Hatsheput, é a construção do que se interpreta como sua segunda tumba, na necrópolis tebana. Se trata, da catalogada como TT 353. Esse singular monumento, parece ter em sua concepção e desenho todas as características rituais do que poderíamos chamar de um recinto de culto para "ka" de Sen-en-Mut, em claro paralelismo com os templos de "Milhões de Anos" dos reis. Está escavado debaixo da terra até levar a coincidir com o pátio do templo de Deir el Bhari. Sabe-se, entretanto, que a verdadeira tumba de Sen-en-Mut se encontra na ladeira de Gurnah, hoje catalogada como TT 71. Da decoração e características arquitetônicas de ambos monumentos se desprende claramente que estavam ritualmente conectados entre si, como estavam as tumbas dos reis em relação aos seus templos de "Milhões de Anos". Nese caso, parece que Sen-en-Mut obteve da rainha o secreto privilégio de compartilhar com ela e seus antepassados os benefícios religiosos e de culto que se realizavam no interior do recinto do templo de Deir el Bahari. Essas concessões converteram a Sen-en-Mut em um rei sem coroa aos olhos de sua amada Hatsheput. No entanto, ela quis conceder-lhe os privilégios que lhe haviam correspondido de haver sido rei coroado das "Duas Terras". A mesma designação de Sen-en-Mut como "Mordomo" e administrador da princesa Neferu-Ra, fez pensar que a princesa pudesse ter sido sua filha carnal, fruto de uma apaixonada relação com a rainha. Essa idéia está validada por uma série de estátuas que representam a Sen-en-Mut com a pequena princesa em atitude amorosa e de proteção que nos faz pensar em um pai com sua pequena filha, do que um tutor friamente responsável por uma princesa. Porém, na verdade, o fato excede os limites da evidência documental e passa para o mundo das possibilidades, por mais atrativa que essa história pareça atrativa aos nossos olhos.

O fim do reinado de Hatshepsut, com a desgraça da morte prematura da princesa Neferu-Ra, traz consigo o final dos favores para Sen-en-Mut, que desapareceu da cena pública, quase ao mesmo tempo que sua rainha. E quanto a Tutmés III, reinando solitário, desposaria em um discreto segundo termo, a segunda filha de Hatshepsut, a princesa Meryt-Ra. Essa princesa lhe transmitiu o sangue da linhagem matrilinear que representava a grande rainha Hatsheput. O filho que deu a Tutmés III, herdaria o trono com o nome de Aa-Jeperu-Ra, Amen-Hotep II (1427-1400 a.C.) Durante o reinado de Hatshepsut, renasce a expressão artística, se produzem novos tipos de escultura e começa a prática de escrever os textos funerários (Livro dos Mortos) sobre papiros. Realizou expedições comerciais à terra de Punt, um país situado na costa da África, ao qual se chegava pelo Mar Vermelho, provavelmente ao norte da Somália. Uma das provas mais cabais da grandeza de Hatshepsut foi a sua capacidade de manter por tanto tempo sob o seu poder um homem do gabarito de Tutmés III. Tutmés tinha inteligência, visão e energia. Iria tornar-se o Alexandre Magno do Egito, o criador do império egípcio. Entretanto, por mais de 20 anos viveu à sombra da mulher de espírito forte que era ao mesmo tempo sua madrasta e tia. Por fim, conseguiu o apoio de que precisava para derrubá-la e vingativo, destruiu grande parte do templo destinado a perpetuar a memória da rainha. Era muito comum no Egito suprimir da história o nome de um predecessor desmoralizado. Mas nem sempre essa providência cumpria o seu objetivo. Como acontece quando se passa a borracha em alguma coisa escrita a lápis, o cinzel deixava quase sempre visível as inscrições originais. No templo e Hapshepsut em EL-Bahri de Deir, perto de Luxor no Vale dos Reis, o nascimento e a coroação da Rainha são descritos em pinturas e outros trabalhos de arte. Uma outra realização, descrita também através das pinturas vívidas, é o transporte de dois obeliscos de granito, ao Templo de Karnak. Os obeliscos foram usados como monumentos religiosos em Egito antigo. Esta poderosa e admirável mulher, Hatshepsut, desapareceu misteriosamente, possivelmente em 1458 a.C, quando Tutmés III tornou-se faraó. Acredita-se que Hatshepsut tenha morrido de morte natural com mais ou menos 55 anos.

ARQUÉTIPO DO DEUS SOL A rainha-faraó Hatsheput, durante todo seu reinado teve seu direito ao trono posto em dúvida por tratar-se de uma mulher que reclamou para si o papel masculino do Deus Sol. Todos os reis-faraós do Egito tinham um nascimento divino que iniciava-se com a escolha da mulher humana que levaria a semente do Deus Sol. Esse depois de impregnar a mãe adotava a forma de seu marido humano. Thoth, o mensageiro dos Deuses, era o encarregado de anunciar a mulher que iria dar a luz ao próximo filho do Deus Sol. O feto recebe do Deus Khnum seu "ka" o espírito nutritivo. Seu nascimento é assistido por inúmeros seres divinos. Ao nascer, toma o título régio de "Filho de Ra". Uma vez criado, o menino-rei estava predestinado para o trono de seu Pai Celestial, e seus deveres estavam sucintamente descritos em uma das mais extraordinárias composições que se conservou do Egito faraônico, recolhida pelo egiptólogo Jan Assmann, que deu ao texto o nome de "O Rei como Sacerdote do Sol". O texto oferece uma descrição da realeza para acompanhar a liturgia dos hinos ao Sol pronunciados pelo rei em certos momentos chaves durante o ciclo solar diário, e por essa razão se inscrevia nas paredes das câmaras relacionadas com esse aspecto de culto, tais como o santuário solar no templo de Hatshepsut em Deir El-Bahri. O texto fala: "Ra coloca o rei sobre a terra dos viventes para sempre e eternamente, para julgar a humanidade e apaziguar os Deuses, para executar a justiça e aniquilar a injustiça; ele deve fazer oferendas divinas aos Deuses, oferendas funerárias aos mortos transfigurados; o nome do rei está no céu igual que o de Ra, ele vive em júbilo como Ra-Horakhty".

MULHER SÍMBOLO DE PODER Hatshepsut é uma personagem extraordinariamente importante, pois representa o poder da mulher em uma sociedade totalmente dominada por homens. No fundo, é um tema bastante atual, muito embora esta história tenha acontecido há milhares de anos, com os prejuízos atávicos próprios desta sociedade. A sociedade atual é carente de mulheres que se disponham a contribuir com o aspecto mais elevado de sua feminilidade: o amor altruísta, a compaixão, o respeito pela vida, com os quais elas estão mais familiarizadas e podem expressar com maior facilidade do que os homens. É desejável para as mulheres, portanto, envolver-se na vida social e política. Se elas escolherem assim, poderão fazer isso enquanto continuam a desempenhar papéis femininos tradicionais em atividades de cunho social. A sociedade deve respeitar e apreciar uma contribuição tão valiosa. O fato de uma mulher dedicar a maior parte do tempo a certos papéis não deve impedi-la de se considerar igual ao homem. Não é uma questão de superioridade ou inferioridade. Características psicológicas masculinas e femininas, muito embora dessemelhantes, são do mesmo valor. Isto é um fato. As mulheres estão certas em protestar contra atitudes preconceituosas que há muito tempo vigoram na sociedade. O cuidado é que com o protesto, não se pode perder a perspectiva. Pode-se ser destrutivo e não construtivo. Conflitos e exageros podem ser entendidos psicológica e historicamente. O ideal é que permanecessem dentro dos limites tão construtivos quanto justos.

Texto produzido por: Rosane Volpatto




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