História do Brasil e do Mundo
O Iluminismo e o Século das Luzes
O contexto histórico em que surgiu o iluminismo
O pensamento ocidental, antes tão marcado pelo misticismo religioso, conheceu a partir do século XVIII uma nova possibilidade de construção sustentada no Racionalismo. O mundo físico e seus fenômenos deixavam de ser justificados pela religião e passavam a ser explicados pela razão. O Iluminismo foi acima de tudo uma revolução cultural porque propôs uma nova forma de entender a natureza e a sociedade e significou uma transformação profunda na forma de pensar, pois rompeu com a maneira como as pessoas pensavam antes.
Vale salientar que apenas uma parcela da população europeia teve contato com as novas ideias e descobertas científicas. A grande maioria da população continuou a pensar o mundo a partir do que ensinavam as teses religiosas.
O Iluminismo também é chamado Movimento das Luzes, Filosofia das Luzes ou Ilustração. O século XVIII é denominado Século das Luzes.
Desde o século XVI, a Europa vivia um processo de múltiplas transformações. As grandes navegações, a Reforma Religiosa, a formação do Estado Nacional e a expansão do comércio foram aos poucos desintegrando o que havia restado da velha ordem feudal. No século XVIII, o mundo preparava-se para viver o tempo do capital e da burguesia. Nesse período houve uma grande expansão demográfica na Europa e um melhor aproveitamento da riqueza produzida pelo comércio. Os capitalistas investiam em avanços tecnológicos que, por sua vez, permitiam acumular riquezas cada vez maiores. Foi nesse contexto de consolidação do universo burguês que as idéias iluministas se estruturaram.
As novas formas de vida e as conquistas humanas da Época Moderna não se articulavam com a rigidez das antigas estruturas de poder político e econômico e, também, do pensamento religioso que dominava a vida intelectual.
As conquistas técnicas abriam possibilidades de avanços em vários campos, com os quais antes não se ousava sonhar. Mas o universo intelectual dominado pelos pressupostos da religião católica condenava o interesse científico, logo apontado como heresia pelo clero, que temia perder seus privilégios econômicos, políticos e sociais.
Iluminismo
O movimento das Luzes realizou uma ampla crítica à forma do poder vigente (Absolutismo) e propôs um novo entendimento da vida social. Dessa forma, a atuação dos iluministas ultrapassou o campo científico, e o Racionalismo foi aplicado à análise social em aspectos como o das relações sociais, da relação entre o governante e os governados, da relação do rei com o Estado e o da religião. O pensamento iluminista, ao mesmo tempo em que refletia o panorama histórico do século XVIII, sedimentava o processo político-revolucionário que teria início no final daquele mesmo século.
As principais formulações do pensamento político do Iluminismo foram:
● Crítica ao absolutismo: não era propriamente uma crítica à monarquia e sim aos abusos cometidos pelos reis absolutos.
● Crítica à tese do direito divino dos reis: por entender que a sociedade e a história são construções humanas, os iluministas não aceitavam a ideia de que o poder real pudesse ser um atributo divino.
● Crítica à participação da Igreja na vida pública: no conjunto das ideias iluministas havia a presença constante da defesa da laicização da vida política e social, ou seja, para os iluministas a religião não deveria interferir na sociedade e na política.
● Defesa do contrato como mediador das relações sociais: uma das obras mais conhecidas daquele período denomina-se Do Contrato Social. Escrito por Rosseau, o texto apresenta a ideia — que depois se tornou universal — de que as relações sociais devem ser definidas por um contrato, um acordo aceito pelas duas partes, e não mais pelo sistema de privilégios do Antigo Regime (termo que se usa para designar a sociedade estamental da Época Moderna, caracterizada pelo Absolutismo e pelo Mercantilismo). Os termos dos contratos sociais devem ser estipulados pela lei, o que tornou necessária a existência de uma Constituição.
Os pressupostos das Luzes estiveram presentes em inúmeras revoluções ocorridas a partir da segunda metade do século XVIII. Essas ideias varreram quase o mundo todo, levando as pessoas a se organizarem para derrubar a sociedade de privilégios que marcou o Estado moderno. Nas colônias americanas, o ideário iluminista estimulou as lutas de independência. No Brasil, as Conjurações Mineira (1789) e Baiana (1798) foram fortemente influenciadas pelo Iluminismo.
TEXTO I: A FÉ DO ILUMINISTA
Os iluministas combateram 35 religiões, sobretudo porque estas faziam uso de mistificações para convencer os fiéis. Mas, por outro lado, não pregavam o ateísmo; pregavam, sim, uma nova forma de relacionamento com a divindade, como podemos observar neste texto de Voltaire.
"O deísta é um homem firmemente persuadido da existência dum ser supremo tão bom como poderoso, que formou todos os seres extensos, vegetantes, sensíveis e reflexivos; que perpetua a sua espécie, que pune sem crueldade os crimes e recompensa com bondade as ações virtuosas. O deísta não sabe como Deus pune, como favorece, como perdoa; pois não é tão temerário que se gabe de conhecer como Deus atua; mas sabe que Deus atua e que é Justo. As dificuldades contra a Providência não abalam a sua fé, porque são somente grandes dificuldades, e não provas... Reunido neste princípio com o resto do universo, não abraça nenhuma das seitas, que todas elas se contradizem. A sua religião é a mais antiga e a mais extensa; pois a simples adoração dum Deus precedeu todos os sistemas do mundo... Crê que a religião não consiste nem nas opiniões duma metafísica ininteligível, nem em vãos aparatos ou solenidades, mas na adoração e na justiça... O maometano grita-lhe: 'Tem cuidado, se não fazes a peregrinação a Meca!' 'Desgraçado de ti, diz-lhe um franciscano, se não fazes uma viagem a Nossa Senhora do Loreto!' Ele ri-se de Loreto e da Meca; mas socorre o indigente e defende o oprimido.
"Voltaire (François-Marie Arouet), 1694-1778. Dicionário filosófico", s. v. "Théiste". In: Gustavo de Freitas (org.). 900 textos e documentos de História, v. 3, p. 11.
TEXTO II: ROUSSEAU A NATUREZA
Jean Jacques Rousseau (1712- 1778), escritor e filósofo francês, nascido em Genebra, nunca escondeu seu profundo amor pela natureza. Especialmente pelas flores e pelas plantas em geral. Pode-se dizer que todo o movimento ecológico moderno provém das conclusões que ele chegou há mais de dois séculos atrás. Ninguém como ele, entre os pensadores e homens de letras daquela época das Luzes, manifestou tamanha satisfação e prazer em manter-se tão próximo às belas coisas da natureza.
Já adulto, Emílio, o personagem de Rousseau, ouve preleção sobre a natureza: religião natural. Ilustração:
Acervo da Fundação Biblioteca Nacional – Brasil.
SENTIMENTO E NATUREZA
"Nesse estado, um instinto que me é natural, fazendo-me fugir de toda ideia entristecedora... me fez, pela primeira vez, ver em seus detalhes, o espetáculo da natureza, que até então só contemplara como uma massa e em seu conjunto"
J.J.Rousseau – Devaneios de um caminhante solitário – 7ª caminhada, 1777 De um certo modo, pode-se considerar a posição de Rousseau, enaltecendo e celebrando a Natureza, como uma reação ao pensamento cartesiano. Um século antes dele, Descartes havia proclamado a emergência de uma filosofia que fosse útil aos homens, que deixasse de ser apenas um exercício especulativo para ajudar eficazmente a humanidade a dominar a Natureza. Contra tal visão utilitarista, de fazer da razão um instrumento de posse e senhorio sobre o mundo que nos cerca, Rousseau propôs uma abordagem sentimental da Natureza. Entendeu-a não como uma possível serva do homem – obediente à razão instrumental - mas como a sua companheira na caminhada da vida.
Também aceita-se a posição dele, de paixão e destemor a Natureza, como resultante de uma certa confiança que o Iluminismo havia dado aos homens do século XVIII, ocasião em que perdeu-se o medo reverencial que havia pelos fenômenos destrutivos, desencadeado pelas fúrias naturais (raios, trovões, enchentes, estiagens, etc...).
A começar pelo invento do pára-raios, obra de Benjamin Franklin, ampliou-se enormemente o controle ou a previsão sobre as hecatombes naturais, espantando assim, aos poucos, o pavor que os homens e as mulheres sentiam frente ao que lhes parecia ser sobrenatural, entendidos como fazendo parte dos “ Mistérios de Deus”. Logo, se a Natureza não era mais a adversária do Homem, se ela não lhe obrigava mais a tremer, a rezar e a rogar por perdão, porque não torná-la uma sócia, uma amiga?
VOLTAIRE SCHILLING(Ensaísta do Portal Terra).
Disponível em Portal Impacto
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