Um vespertino que será sempre o arauto das aspirações cariocas (Rio de Janeiro, 1929)
Fundado no Rio de Janeiro (RJ) em 5 de outubro de 1929, dirigido por Francisco de Assis Chateaubriand Bandeira de Mello (seu dono formal), Cumplido de Sant?Anna e Frederico Barata, o Diário da Noite foi um vespertino em complemento ao matutino O Jornal, também de ?Chatô?. Apresentava-se como membro da ?vanguarda do movimento liberal?, ou seja, era explicitamente articulado com a Aliança Liberal, em oposição ao regime oligárquico da República Velha. Lançado em duas edições diárias, saindo a primeira às 15h, foi um empreendimento totalmente projetado em apenas duas semanas, tendo conquistado entre 60 e 80 mil leitores em seu primeiro mês de circulação. Editado até 1973, foi mais um dos inúmeros periódicos dos Diários Associados, a rede de comunicação iniciada por Chateaubriand nos anos 1920.
Após a compra de seu primeiro periódico, O Jornal, em 1924, no ano de 1925 Assis Chateaubriand deu mais um passo na construção de seu império ao comprar o vespertino Diário da Noite, de São Paulo (SP), fundado em 7 de janeiro de 1925. Em 1928, Chatô lançou a célebre revista O Cruzeiro, que revolucionou o mercado editorial brasileiro. O Diário de Notícias de Porto Alegre (RS), fundado em 1º de março de 1925, foi incorporado à rede de Chateaubriand em 1929, assim como O Estado de Minas, lançado um ano antes. Em 5 de janeiro de 1929 Chatô ainda lançava o matutino Diário de São Paulo ? um contraponto ao Diário da Noite paulistano, dirigido por Rubens do Amaral ? e, meses depois, o Diário da Noite do Rio de Janeiro. Assim, estava oficialmente fundada a cadeia dos Diários Associados, a primeira rede de comunicação brasileira, que, em seu auge, contabilizaria 36 jornais, 18 revistas, 36 rádios e 18 emissoras de televisão.
Havia um porquê para a expansão do empreendimento de Chateaubriand, em 1929. No fim do governo de Washington Luís, O Jornal apoiava com entusiasmo a articulação do Rio Grande do Sul, da Paraíba e de Minas Gerais em torno da Aliança Liberal, abraçando a campanha de Getúlio Vargas à presidência da República ? segundo Austregésilo de Athayde, este visitou várias vezes a sede do diário, para conspirar com Chatô contra Washington Luís. Os Diários Associados surgiram em consequência desse apoio à Aliança Liberal: alimentavam-se dela e alimentavam-na. Naturalmente, os jornais da rede deram grande destaque à chamada Revolta de Princesa, ocorrida em fevereiro de 1930 na Paraíba, contra o presidente estadual João Pessoa, candidato à vice-presidência da República pela mesma chapa que Getúlio; em julho as folhas de Chateaubriand culpavam formalmente o governo pelo assassinato de João Pessoa. Finalmente, em outubro daquele ano, O Jornal e seus periódicos irmãos, como o Diário da Noite, deram total apoio à Revolução de 1930. Publicando todo o programa revolucionário, o vespertino carioca dos Associados abria sua primeira página de 24 de outubro daquele ano com as manchetes ?Viva o Brasil! Viva a República nova e redimida!? e ?Os ideaes da pátria venceram!?.
Contrariando qualquer expectativa, a década de 1930 não foi totalmente favorável a Chateaubriand e aos Associados. Logo depois que o Governo Provisório foi instalado por Getúlio Vargas, começaram a surgir divergências entre os Diários Associados e a nova situação. Chatô pregava contra o estabelecimento de um governo ditatorial no Brasil, pedindo a rápida reconstitucionalização do país. Ligado a um grupo integrado por Lindolfo Collor, Batista Luzardo e Raul Pilla, Chateaubriand levou sua rede a apoiar a Revolução Constitucionalista de 1932; o que resultou no confisco da sede e da maquinaria do principal diário da rede, muito pelas mãos de João Alberto Lins de Barros, e no exílio de Chatô.
Chatô voltou ao Brasil no final de 1933. Conseguiu então retomar O Jornal e as demais empresas, mas passando a direção geral a seu sogro, Zózimo Barroso do Amaral, figura ligada ao governo; de certa forma, a presença deste à frente dos Associados era um movimento de intenção conciliatória de Chateaubriand em relação a Vargas. Nessa retomada à publicação, a rede também aproveitou os andamentos da Assembleia Nacional Constituinte, em novembro de 1933: ali, Chatô aproximou-se da ala mais conservadora da situação, sobretudo dos irmãos Virgílio e Afonso Arinos de Mello Franco, entre outros. No entanto, quando do fim do mandato constitucional de Getúlio Vargas, na abertura da questão sucessória, os Associados não apoiaram o candidato de situação, José Américo de Almeida, abraçando a candidatura oposicionista de Armando de Sales Oliveira à presidência da República.
Com o início do Estado Novo, após o golpe de 10 de novembro de 1937, os Associados não foram extintos, mas passaram a sofrer forte controle estatal. Com o fim do Estado Novo em 29 de outubro de 1945 e a redemocratização, os jornais de Chateaubriand apoiaram a candidatura da União Democrática Nacional (UDN) à presidência da República, através do brigadeiro Eduardo Gomes. Mesmo assim, os periódicos aplaudiram as principais medidas do governo do general Eurico Gaspar Dutra, candidato do Partido Social Democrático (PSD) que saiu vitorioso. Ao longo dos anos 1940 os Diários Associados promoveram campanhas de responsabilidade social empresarial, sobretudo nas áreas da aviação, da saúde, do transporte e da cultura.
Com o fim do mandato de Dutra, em 1950, os Associados acabaram, pelo desenrolar da engrenagem política, paradoxalmente, dando respaldo à candidatura de Getúlio Vargas, embora discretamente. Apesar disso, com o início do segundo governo getulista, logo as discordâncias da rede com o poder reapareceram. Muito se deveu ao fato de Chateaubriand bater de frente com Vargas ao defender o ingresso do Brasil na exploração petrolífera com ajuda de capital estrangeiro. Ademais, o empresário ainda considerava necessária a ajuda externa para a construção de ferrovias, portos e rodovias. Assim, ao fim do governo Vargas, os jornais já se encontravam em franca oposição.
Quando ocorreu o atentado da rua Toneleros, em 5 de agosto de 1954, onde saiu ferido o oposicionista Carlos Lacerda e morto o major-aviador Rubens Vaz, O Jornal, o Diário da Noite e seus irmãos de fora do Rio de Janeiro já estavam solidamente atrelados à UDN. Com o suicídio de Vargas no dia 24 daquele mês, os periódicos deram apoio ao governo do vice-presidente Café Filho, cercado de figuras udenistas. Cerca de um ano depois, em 11 de novembro de 1955, quando o general Henrique Teixeira Lott depôs o presidente interino Carlos Luz para garantir a posse de Juscelino Kubitschek, Chatô se manteve ao lado da legalidade, afastando-se, portanto, da UDN.
No governo Kubitschek, os Associados foram tanto contrários quanto partidários da situação. A construção de Brasília, por exemplo, foi encarada como uma importante medida de desenvolvimento para o oeste brasileiro, mas também como um possível causador de processo inflacionário. Foi nesse período em que Assis Chateaubriand foi eleito senador pelo Maranhão, na legenda do PSD, para depois assumir como embaixador brasileiro em Londres. No fim do mandato de JK, os diários da rede passaram a apoiar não o candidato udenista, Jânio Quadros, visto negativamente pelo seu governo em São Paulo, mas a candidatura de Henrique Teixeira Lott, pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). Com Quadros no poder, os jornais mostraram grandes preocupações, fazendo oposição à política externa independente adotada e à condecoração de Ernesto ?Che? Guevara pelo mandatário. Nesse período, em 21 de setembro de 1959, Chateaubriand criou o Condomínio Acionário dos Diários Associados, modelo de gestão então inédito no Brasil, formado por 22 condôminos responsáveis pela perenidade dos órgãos da rede sem, no entanto, firmarem-se como donos ? com isso, Chatô garantia a vida do grupo após a sua morte.
A renúncia de Quadros foi recebida pelos jornais Associados como ato que pretendia mandá-lo de volta ao poder via golpe, para o estabelecimento de um governo ditatorial e autoritário. A posse do vice-presidente João Goulart foi então bem recebida pela rede. Durante o mandato de Jango, Chatô manifestou contrariedade com relação ao sistema parlamentarista, que vigorou no Brasil entre setembro de 1961 e janeiro de 1963. Em paralelo, o empresário hostilizava a política considerada de esquerda permitida pelo presidente, opondo-se violentamente às reformas de base propostas pelo Executivo. Com o tempo, portanto, Chateaubriand foi desconsiderando o governo Goulart, dando, por fim, total apoio ao golpe militar, em março de 1964. Até o início dos anos 1960, Austregésilo de Athayde e Orlando Mota eram os diretores responsáveis pelo Diário da Noite, contando com Paulo Vial Corrêa como diretor de redação e Carlos Eiras como secretário. Desde 1963, no entanto, Edmundo Monteiro assumiu a direção do jornal, onde ficaria até o fim da publicação. Apesar de seu título, o diário tinha então, eventualmente, edições matutinas.
Com exceção de um desentendimento com Humberto Castelo Branco, com relação ao valor arrecadado pela campanha ?Dê ouro para o bem do Brasil?, promovida pelos Diários Associados, no restante da ditadura militar, a rede apoiou o governo. O Diário da Noite e O Jornal estiveram ao lado de Artur da Costa e Silva e de Emílio Garrastazu Médici, mas, em péssimas condições financeiras, causadas por má administração, o vespertino acabou fechando as portas em junho de 1973. No ano seguinte, o matutino também seria encerrado. Os Diários Associados, entretanto, continuaram sua trajetória.
Fontes:
? Acervo: edições do nº 175, ano 2, de 1º de maio de 1930, ao nº 14.594, ano 49, de 22 de junho de 1973.
? CARNEIRO, Glauco. Brasil, primeiro: história dos Diários Associados. Brasília: Fundação Assis Chateaubriand, 1999.
? LEAL, Carlos Eduardo. O Jornal. In: Dicionário histórico-biográfico brasileiro pós-1930, vol. 3. Coord. ABREU, Alzira Alves de? [et al.]. Rio de Janeiro: Editora FGV; CPDOC, 2001.
? Memória Diários Associados. Disponível em: http://www.diariosassociados.com.br/linhadotempo/decada20.html. Acesso em 14 jan. 2014.
? SODRÉ, Nelson Werneck. História da imprensa no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1966.