Vestuário e higiene no Brasil colônia.
História do Brasil e do Mundo

Vestuário e higiene no Brasil colônia.


  Da imposição de vestuário europeu a populações habituadas à pura nudez ou a cobrirem-se apenas o bastante para lhes decorar o corpo ou protegê-lo do sol, do frio ou dos insetos conhecem-se hoje os imediatos e profundos efeitos disgênicos. Atribui-se ao seu uso forçado influência não pequena no desenvolvimento das doenças da pele e dos pulmões que tanto concorrem para dizimar populações selvagens logo depois de submetidas ao domínio dos "civilizados"; doenças que no Brasil dos séculos XVI e XVII foram terríveis.
    O vestuário imposto aos indígenas pelos missionários europeus vem afetar neles noções tradicionais de moral e higiene, difíceis de se  substituírem por novas. É assim que se observa a tendência, em muitos dos indivíduos de tribos acostumados à nudez, para só se desfazerem da roupa européia quando esta só falta largar de podre ou de suja. Entretanto são povos de um asseio corporal e até de uma moral sexual às vezes superior à daqueles que o pudor cristão faz cobrirem-se de pesadas vestes.
     
Banhos públicos romanos. Pompeianas no Frigidarium,
 pintado por Pedro Weingartner 1897.
 
Quanto ao asseio do corpo, os indígenas do Brasil eram decerto superiores aos cristãos europeus aqui chegamos em 1500. Não nos esqueçamos de que entre estes exaltam-se por essa época santos como Santo Antão, o fundador do monaquismo, por nem os pés dar-se à vaidade de lavar; ou como São Simeão,  o Estilita, de quem se sentia a inhaca do sujo. E não seriam os portugueses os menos limpos ente os europeus do século XVI, como a malícia antilusitana talvez esteja a imaginar; mas, ao contrário, dos mais asseados, devido à influência dos mouros. 
(...)
     Pela Europa os banhos à romana, ou de rio, às vezes promíscuos, contra os quais por muito tempo a voz da Igreja clamara em vão, haviam cessado quase de todo, depois das Cruzadas e dos contatos comerciais mais íntimos com o Oriente. O europeu se contagiara de sífilis e de outras doenças, transmissíveis e repugnantes. Daí resultara o medo ao banho e o horror à nudez. 
      Em contraste com tudo isso é que surpreendeu aos primeiros portugueses e franceses chegados nesta parte da América um povo ao que parece sem mancha de sífilis na pele; e cuja maior delícia era o banho de rio. Que se lavava constantemente da cabeça aos pés; que se conservava em asseada nudez; que fazia uso de folhas de árvores, como os europeus ainda mais limpos de toalhas de enxugar as mãos e de panos de limpar menino novo; que ia lavar no rio a sua roupa suja, isto é, as redes de algodão - trabalho esse, a cargo dos homens. 
                 Adaptado de: FREYRE, Gilberto, Casa-grande e senzala, São Paulo, Circulo do Livro, p. 143-7. 1. ed., 1933.




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