O filósofo contra o corrupto: Cícero acusa Catilina de planejar uma conspiração contra o Senado/Cícero denuncia Catilina, afresco, Cesare Maccari, 1882-1888
Consideradas um símbolo da vitória da moral sobre a corrupção na vida pública, as Catilinárias de Cícero registram o derradeiro triunfo do regime aristocrático na Roma antiga
Em 63 a.C., Marco Túlio Cícero, o maior filósofo romano de todos os tempos, ocupava o posto de cônsul, cargo máximo do Senado, quando descobriu que um de seus colegas organizava uma conspiração para assassiná-lo. O mentor do complô era o senador Lúcio Catilina, nobre arruinado por dívidas que contava com o apoio de outros homens ricos e militares igualmente debilitados financeiramente para tomar o poder.
Ao se inteirar dos planos de seu adversário, Cícero convocou uma reunião do Senado e proferiu o primeiro de seus quatro célebres discursos contra Catilina, que ficariam conhecidos como Catilinárias. A intervenção de Cícero se tornou um clássico da política e passou a ser invocada ao longo dos últimos 2 mil anos sempre que um homem público atenta contra o interesse geral da população.
Tomadas como um exemplo de correção no exercício do poder público, as Catilinárias revelam, na verdade, um momento muito específico da história de Roma: aquele em que a República aristocrática lutava para resistir às investidas de generais e políticos amparados por um poder militar cada vez maior.
Por fim, Cícero conseguiu sufocar a revolta de Catilina e deu uma sobrevida de mais alguns anos à República romana. O regime, porém, seria finalmente ferido de morte quando Júlio César cruzou o rio Rubicão e invadiu a península Itálica com suas legiões em 49 a.C.
Trechos do discurso
?Até quando, enfim, ó Catilina, abusarás da nossa paciência? Por quanto tempo ainda este teu rancor nos enganará? Até que ponto a tua audácia desenfreada se gabará?? (Livro I, cap. I)
?Agora [tu, Catilina] já atacas abertamente toda a República; chamas para o extermínio e para a devastação os templos dos deuses imortais, as casas da cidade, e a vida de todos os cidadãos, enfim, a Itália inteira.? (Livro I, cap. V)
?Efetivamente nenhuma nação existe que temamos; nenhum rei há que possa fazer a guerra ao povo romano. Todas as coisas externas estão pacificadas (...) resta só a guerra doméstica.? (Livro II, cap. V)
Revista História Viva