História do Brasil e do Mundo
Os heróis gregos
Herói s.m. (Do gr. e lat. heros) 1. Nome dado pelos gregos aos grandes homens divinizados. - 2. Aquele que se distingue por seu valor ou por suas ações extraordinárias, principalmente por feitos brilhantes durante a guerra. - 3. Principal personagem de uma obra literária (poema, romance, peça de teatro, etc.) ou cinematográfica; protagonista. - 4. Principal personagem de uma aventura, de um acontecimento. (Grande Enciclopédia Larousse Cultural, 1998, v. 12, p. 2954).
Hoje é comum ouvirmos falar de heróis na vida real, aqueles que surgem durante as tragédias que acometem a humanidade a cada dia, ou na mídia (romances, poemas, filmes, etc). Todavia, ainda fica restrito ao cinema e as histórias em quadrinhos (HQs) o lar dos mais cultuados e venerados heróis dos últimos cem anos. No século vinte através destas histórias, vimos o surgimento dos super-heróis e dos anti-heróis, além de várias heroínas, algo que outrora não era bem visto, já que essencialmente, o heroísmo era algo masculinizado. Contudo neste texto falarei de heróis que pertencem a um outro tempo, heróis bem mais antigos que Robin Hood e o Rei Arthur que tiveram seus feitos cantados durante o período medieval.
Contudo não irei aqui debater quais figuras históricas foram heroicas ou vilãs, mas falarei da origem do sentido de herói, do conceito do herói clássico. E voltando a este ponto, retornaremos a mais de dois milênios à Grécia Antiga, onde heróis já tinham seus feitos cantados, lendas e mitos que ainda ecoam no tempo por mais de dois mil anos.
AQUILES E A GUERRA DE TROIA
Inegavelmente o grande arquiteto do culto ao herói foi o poeta Homero, figura lendária ou não, é lhe atribuído os dois mais famosos poemas heroicos da Antiguidade Clássica, a Ilíada que narra a Guerra de Troia e a Odisseia que narra as aventuras de Odisseu (Ulisses) para retornar ao seu lar, a ilha de Ítaca. Na Ilíada, Homero imortalizou na história os nomes de Aquiles, Agamemnon, Menelau, Helena, Ajax, Odisseu, Príamo, Páris, Eneias, Heitor e muitos outros. Cada um destes homens foram tidos como grandes heróis na história, cada um com suas virtudes e vícios, não podemos esquecer um fato que deve ser mencionado; diferente da visão que possuímos propriamente hoje sobre o que é ser um herói, no que refere-se a ser uma pessoa boa, que arrisca sua própria vida para ajudar os outros, uma pessoa corajosa, brava, forte, determinada, etc., essas qualidades já eram cultuadas entre os heróis gregos, porém o que os diferem dos heróis de hoje, é que tais homens eram guiados por seus vícios, desejos, ambições e orgulhos.
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Aquiles arrastado o corpo de Heitor. |
Não podemos esquecer que a Guerra de Troia foi iniciada propriamente pelo rapto de Helena (alguns não veem um sequestro, mas sim uma fuga aceita, ou seja, Helena concordou em fugir com seu amante), rainha de Esparta pelo príncipe troiano Páris. Por tal motivo, o rei de Esparta, Menelau foi pedir ajuda ao seu irmão Agamemnon, rei de Micenas, o qual aproveitou a desculpa de resgatar a esposa do irmão para conquistar e destruir Troia. E em meio a este dilema de decretar guerra aos troianos, Agamemnon propôs um acordo com todos os reis da Grécia que juntassem suas forças para acabar com os troianos, e dentre estes reis estava o impulsivo Aquiles, filho da deusa Tétis e de Peleu, rei dos mirmidões.
Nesse ponto outra característica sobre o herói grego surge, a condição divina. Alguns dos principais heróis gregos eram semideuses, principalmente filhos de deuses com mulheres mortais. Assim, o caráter semidivino do herói já lhe concedia um status quo de um ser superior, nem deus e nem um simples mortal. Aquiles dispunha destas características as quais ficaram marcadas com o seu famoso ponto fraco, o calcanhar esquerdo.
Se por um lado Aquiles era um homem divino, que possuía força e resistência sobre-humanos, ele era um homem orgulhoso, teimoso, impaciente, prepotente e arrogante, características das quais outros heróis dispunham. O herói grego necessariamente não era aquele que arriscava a vida para salvar os outros, mas aquele que procurava por glória, fama, por superar os limites dos humanos. Aquiles partiu para Troia atrás de glória, e de fato este a conseguiu com sua morte, seus feitos ficaram imortalizados nas páginas da Ilíada. Embora que Homero não esperasse que o seu poema se tornasse tão famoso assim.
Se por um lado, Aquiles, Agamemnon, Menelau representam o orgulho grego, Heitor e Eneias representavam o orgulho troiano, serão estes os principais heróis troianos que farão de tudo para proteger sua terra natal. Heitor será apenas um mero mortal, mas Eneias será um semideus, filho de Afrodite e Anquises. De fato Eneias perpetuará o legado troiano, fugindo com o seu pai e alguns poucos sobreviventes de Troia. História essa contada pelo poeta Virgílio (70-19 a.C) em seu famoso livro, A Eneida.
TESEU
Passando para outros mitos, podemos notar características semelhantes. No mito de Teseu e o Minotauro, o jovem príncipe ateniense indignado com o tributo cobrado por Minos, rei de Creta, o qual cobrava o envio de sete rapazes e moças virgens para serem devorados pelo Minotauro, a fim de que Creta não entrasse em guerra com Atenas, decidiu por fim a isso. Assim, Teseu esboça a valentia do herói grego, a determinação a bravura em defender o seu povo e a sua pátria. Teseu retorna vitorioso de Creta tendo atravessado o labirinto projetado por Dédalo e matado a terrível besta, porém antes de partir da ilha ele foge com uma das filhas de Minos, Ariadne a qual ajudara Teseu, lhe dando um novelo de lã para que ele pudesse encontrar o caminho de volta no labirinto, nesse ponto outra característica marca as histórias dos heróis gregos, a tragédia.
Teseu acabou abandonando Ariadne em uma ilha e retornando para Atenas, ao chegar descobrira que seu pai, o rei Egeu achando que o filho havia morrido, acabou cometendo suicídio, se jogando de um precipício ao mar, daí o nome do mar se chamar Egeu. Teseu se tornara rei de Atenas, mas é lembrado no fim do mito como um péssimo governante, despreocupado com suas responsabilidades.
BELEROFONTE
O mesmo caso pode ser notado no mito de Belerofonte e a Quimera. Belerofonte era um semideus, filho de Poseidon (em outras versões era um mortal, filho do rei Glauco). Sua história é bem atribulada, antes de se tornar herói, Belerofonte causou afrontas a outras pessoas, cometeu um assassinato, foI expulso de sua cidade, se exilou na corte de outro rei, foi seduzido pela rainha deste rei, mas para evitar problemas a repudiou. A rainha acusou Belerofonte de tentar tê-la cortejá-la ou estrupa-la, isso levou a ter que fugir, indo para a Corte dos Lóbates. Lá, o rei lhe dera a difícil tarefa de matar o monstro Quimera, Belerofonte com a ajuda de Pégaso, a quem havia conseguido domar graças a ajuda dada pela deusa Atena, voou em direção ao covil da fera, e com um único golpe bem dado, ele derrotou a Quimera, vitorioso, Belerofonte decidiu se gabar de sua vitória aos deuses e voou em direção ao Olimpo.
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Belerofonte e Pégaso enfrentando a Quimera. |
Zeus indignando que um mortal realizasse tal afronta enviou uma vespa ou abelha para picar Pégaso. Após ser picado, o cavalo derrubou Belerofonte, mas Atenas salvou sua vida, todavia Pégaso foi embora e nunca mais o herói o viu. Então ele decidiu abandonar seu direito ao trono, pois seu pai havia morrido por esta época, e decidiu partir a procura do cavalo alado. O herói morreu como um andarilho miserável, seu orgulho foi literalmente sua queda.
Se por um lado, Teseu e Belerofonte, partiram do princípio de ajudar os outros a fim de derrotar temíveis feras, mas também procurando por glória, houve um herói que também buscou glória, mas tornou-se um herói também por realizar aventuras e salvar uma donzela em perigo. Este herói chamava-se Perseu.
PERSEU
Acrísio de Argos, recebera a notícia do oráculo de que seu neto iria matá-lo, porém Acrísio só possuía uma filha e essa não possuía filhos, sua filha chamava-se Dânae. Temendo a previsão do oráculo, Acrísio aprisionou a filha em uma caverna, onde passou a ficar dia e noite sendo vigiada por guardas, contudo Zeus o rei dos deuses se encantou por sua beleza e desejou possuir Dânae. Zeus se transformou em uma "chuva de ouro" e escorreu pelas brechas da rocha até o recinto onde se encontrava a princesa. Meses depois, Acrísio descobriu que sua filha havia engravidado e dado a luz a um menino, Dânae dissera ao pai que aquela criança era filho de Zeus, mas o rei não acreditou naquilo, suspeitando que um dos guardas a tivesse engravidado. Além de cuidar de executar os guardas responsáveis, o rei ordenou que sua filha e neto fossem jogados ao mar. Os dois foram colocados dentro de um barco sem remos, e largados a deriva, porém Zeus os salvou, os levando em segurança até as praias da ilha de Sérifo.
Perseu e sua mãe viveram os anos seguintes na ilha, Perseu se tornou um homem forte, corajoso e ambicioso. Nessa época o rei de Sérifo, Polidectes cobiçava Dânae por sua beleza, o rei era um tirano, um homem arrogante e escrupuloso. Sabendo que Perseu não aceitaria o casamento, tivera a ideia de se livrar dele, assim Polidectes promoveu um desafio, quem lhe trouxesse a cabeça da temível górgona Medusa, seria dado uma grande recompensa, assim todos os bravos guerreiros da ilha foram convocados, Perseu, o qual possuía grande ambição e buscava por glória, decidiu participar do desafio, sem sua mãe saber.
No mito, Perseu recebe a ajuda dos deuses: seu pai Zeus, lhe dá uma espada; Hades lhe empresta o capacete da invisibilidade; Hermes lhe emprestará suas sandálias aladas; por fim, Atena lhe dera um escudo de bronze, tão bem polido que parecia um espelho. Perseu foi procurar as irmãs Greias, para saber a localização do covil da Medusa. Depois de saber a direção, ele voou até lá.
Ele conseguiu derrotá-la e decepar sua cabeça, depois disso ele viajou por outros locais da África (pois a ilha ficaria próxima ao continente africano), onde acabou conhecendo Atlas, o titã que sustentava o mundo ou o céu sobre as costas; o Jardim das Hespérides; e finalmente ele chegou a Etiópia, onde governava o rei Cefeu e sua esposa Cassiopeia. A Etiópia aqui seria um lugar mítico, e não necessariamente o país que conhecemos hoje.
Na ocasião, Cassiopeia havia ofendido as nereidas, as filhas do deus Nereu, e as mesmas foram contar a Poseidon sob o ocorrido. O deus temperamental (pois Poseidon provocava tempestades e terremotos) enviou um monstro para destruir a capital da Etiópia. O rei Cefeu indo consultar o oráculo, este dissera que ele teria que oferecer sua filha Andrômeda em sacrifício ao monstro marinho, a fim de salvar a cidade.
Perseu avistou a jovem donzela acorrentada a um rochedo. Ele usou a cabeça da Medusa e transformou o monstro em pedra, então libertou Andrômeda. Perseu salvara Andrômeda, e posteriormente pediu-a em casamento, então os dois retornaram para Sérifo. Lá ele chega no momento do casamento do rei Polidectes com Dânae, a qual foi forçada a se casar. Perseu usa novamente a cabeça da medusa e petrifica o rei e seus soldados. De lá ele leva sua mãe e sua esposa para a Grécia, onde funda as cidades de Corinto e Micenas, onde passou a governar como rei até o fim da vida.
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Perseu resgatando Andrômeda |
A questão do destino, onde foi determinado que Perseu mataria seu avô se revela anos depois, quando o herói participava da celebração de alguns jogos, quando acabou arremessando um dardo ou um disco, e por acidente acertou um velho rei, este era o seu avô, Acrísio, o qual acabou morrendo. Assim, o oráculo se concretizara.
JASÃO E OS ARGONAUTAS
Hoje em dia nos quadrinhos costumamos ver a reunião de heróis, que formam grupos para combater os vilões, o mal e salvar o mundo ou até mesmo o universo. A Liga da Justiça, a Tropa dos Lanternas Verdes, Os Vingadores e os X-Men, são os principais representantes da união de heróis, mas a primeira liga de heróis famosa da história, foram os Argonautas.
Tudo começou quando o príncipe Jasão ficou sabendo que seu pai, o rei Esão estava muito doente. Jasão o qual vivia sob a tutela do centauro Quíron, o chamado mestre dos heróis, voltou para casa, lá seu ambicioso tio Pélias, o qual almejava o trono torcia pela morte do irmão, mas sabia que o sobrinho era o herdeiro legal, assim Pélias, decidira se livrar de Jasão, e para isso ele convenceu o sobrinho partir em busca do Véu de Ouro (chamado também de velocino, velo e tosão), a lã de um carneiro, que dizia poder curar qualquer doença, tal véu ficava no reino da Cólquida (atual Geórgia) na Ásia. Jasão aceitou o desafio e com a ajuda de Atena ele reuniu sua tripulação composta por alguns importantes heróis de seu tempo. Ao todo foram cerca de 40 ou 50 tripulantes do navio Argo, os quais passaram a ser chamados de argonautas. Dentre alguns nomes, figuram: Castor e Pólux, Orfeu, Teseu, Héracles, Iolau, Calais e Zetes, Laertes, Peleu, Telámon e o rei Argos. Alguns dos tripulantes, eram reis, outros eram semideuses, e outros heróis conhecidos, e pai de futuros heróis. Argos foi o responsável por ceder o material e os escravos para construir o navio.
Ao longo da viagem eles enfrentaram monstros, tempestades, se perderam; alguns tripulantes desertaram ou morreram, mas no fim Jasão retornou vitorioso, trazendo consigo o Véu de Ouro. A viagem ou jornada dos argonautas perfaz uma odisseia de grandes aventuras e perigos, porém a jornada mais famosa da Antiguidade Clássica, foi a Odisseia narrada por Homero.
ODISSEU
A Odisseia consiste em uma continuação da Ilíada, tendo foco na jornada de Odisseu (Ulisses para os romanos) para sua casa, a ilha de Ítaca. Odisseu era filho de Laertes e de Anticleia, ambos eram mortais, logo o filho era um humano comum, mas o que torna Odisseu digno de pertencer a categoria de herói, não foi apenas sua bravura e determinação mas, sua inteligência. Odisseu foi um dos poucos heróis gregos que se valeram da razão para transpor obstáculos, isso fica evidente durante a Guerra de Troia, onde após dez anos de conflito, os gregos já sem esperança de vitória, são presenteados com uma brilhante ideia, o Cavalo de Troia. Ao longo da Ilíada, Homero atribui os epítetos de "sagaz" e "engenhoso" a Odisseu, e a própria deusa Atena, diz que ele era um homem prudente nas decisões que tomava, assim ele elaborara o brilhante, mas traiçoeiro plano do Cavalo, que no final concedeu a vitória aos gregos.
Todavia, a sagacidade e inteligência deste herói não reside apenas neste ato, ao longo de sua jornada de volta para casa, outros perigos testaram a razão de Odisseu, e na minha opinião o mais clássico de todos os exemplos diz respeito a conversa de Odisseu com o ciclope Polifemo. Quando a tripulação desembarcou na ilha dos Ciclopes em busca de suprimentos, Odisseu e alguns membros de sua tripulação acabaram chegando a uma caverna a onde encontram queijo, leite, lã e peles de cabra, logo eles constataram que pastores vivessem naquela ilha, então eles decidiram esperar pela volta destes, e enquanto isso, passaram a se servir da comida disponível. Ao entardecer eles ouviram o som das cabras e ovelhas, e logo as avistaram entrando na caverna, curiosos em saber quem eram estes pastores, mas a sua surpresa, eles se depararam com um gigante de um único olho, um ciclope.
O ciclope fechou a entrada da caverna com uma enorme pedra, então começou a ordenhar as ovelhas e as cabras, e depois as conduziu até um curral, até o presente momento ele não havia notado a presença dos visitantes os quais haviam se escondido. Quando o ciclope acendeu uma fogueira, e a luz iluminou o interior da caverna, isso acabou revelando os gregos. Odisseu inicialmente conversou com o gigante, o qual acabou devorando alguns de seus tripulantes, todos acabaram ficando assustados com aquilo, porém a situação era pior, eles estavam a mercê da voracidade daquela fera, e ao mesmo tempo, mesmo que conseguissem matá-lo, eles não conseguiriam remover a enorme pedra que bloqueava a entrada, então Odisseu mantendo a calma tivera um plano engenhoso.
Os trechos a seguir foram traduzidos do espanhol:
"Então aproximei-me do ciclope, e, tendo em mãos uma taça de negro vinho, falhei-lhe desta maneira:"
"- Ciclope! Já que comesse carne humana, toma e bebe este vinho, e saberás que licor encontra-se em nosso navio. Para ti, eu o trago, desejoso de oferecê-lo, em troca que me deixe regressar a minha pátria. Mas, a ninguém te iguala na cólera! Insensato! Como se aproximará de ti algum nascido em diante, se careces de compaixão?"
"Assim eu lhe falhei: e tomou o vinho e o bebeu, e gostou tanto do doce que me pediu mais."
"- Dei-me de bom grado mais vinho e faça-me saber imediatamente o seu nome para que te ofereça uma hospitalidade com a qual se alegrará. Pois também aos Ciclopes a fértil terra lhes proporciona uvas em graúdos cachos, que crescem com a chuva enviada por Zeus; porém este foi feito com néctar e ambrosia."
"Falou assim, e voltei a servi-lo o negro vinho; três vezes o presentei e três vezes bebeu com muito gosto. E quando os vapores do vinho envolveram a mente do Ciclope, disse-lhe com lisonjeiras palavras."
"- Ciclope! Perguntas qual é o meu ilustre nome, e vou dizer-lo; porém dei-me a hospitalidade que me prometera. Meu nome é Ninguém, e Ninguém é assim que me chamam meu pai, minha mãe e todos os meus companheiros."
"Assim eu lhe falei; e em seguida me respondeu com um ânimo cruel."
"- A Ninguém eu o comerei por último, depois de seus companheiros, e a todos os demais antes dele: tal será a minha hospitalidade que lhe ofereço."
Polifemo depois disso deitou-se e caiu em um profundo sono. Enquanto o ciclope dormia, Odisseu junto com seus homens fabricaram uma lança, para que assim pudessem cegar o gigante enquanto este dormia, ao mesmo tempo não iriam matá-lo, e provavelmente ele iria pedir ajuda aos outros ciclopes que moravam na ilha e para isso teria que remover a pedra da entrada. Assim, quando o dia raiou, Odisseu cravou a lança no olho de Polifemo, o qual berrou de fúria e dor, e seguiu tateando pela parede até a entrada, este removera a enorme pedra e gritou por socorro.
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Odisseu perfurando o olho de Polifemo. |
"- Porque tanta raiva, ó, Polifemo! Gritas de semelhante modo? Por acaso algum homem lhe levou suas ovelhas sem você ter dado conta? Ou por ventura, te enganaram ou te feriram?"
"E o robusto Polifemo de sua caverna lhes respondeu."
"- Ó, amigos! Ninguém me enganou. Não com força."
"E eles lhe contestaram com estas palavras:"
"- Pois se ninguém te atacou, já que estás sozinho, não é possível evitar a desgraça que te envia o grande Zeus; porém roga a teu pai, o soberano Poseidon."
Polifemo sendo tolo e ingênuo acabou dizendo aos outros amigos que Ninguém o havia enganado, mas não se valera da força. Logo os ciclopes riram da desgraça de Polifemo, dizendo que ele havia se machucado sozinho, após isso, Odisseu tivera a ideia de se esconder sob as ovelhas, se amarrando nestas, e assim poderiam sair da caverna sem serem sentidos pelo tato do ciclope que apalpava o chão. Mas, depois que eles conseguiram retornar para o navio, Polifemo suplicando ao seu pai, o rei dos mares, Poseidon, pediu que este o vinga-se. Assim, Poseidon amaldiçoou Odisseu e sua tripulação. Todavia, este momento exprime a vitória da razão sobre a força, já que quando Polifemo refere-se a engano, ele remete a questão da astúcia, da sagacidade, ou seja, eles não se valeram da força para subjugá-lo, mas sim da inteligência.
HÉRACLES
Por fim, não se poderia encerrar este texto sem falar do maior herói grego, Héracles (Hércules para os romanos). Se os caros leitores prestaram atenção em meio as narrativas de algumas das aventuras destes heróis, devem ter percebido, que os heróis supracitados, foram reis. Um fato curioso é que, muitos dos heróis gregos foram reis, príncipes ou possuíam alguma ligação com a nobreza, nesse caso Héracles não foi um rei, mas pertencia a nobreza divina e humana. Seu pai era Zeus, reis dos deuses e sua mãe era Alcmena, a qual pertencia a Casa Real de Perseu, logo Héracles era meio-irmão de Perseu por parte de pai e descendente deste por parte de mãe, já que Perseu viveu pelo menos três gerações antes de Héracles. Todavia, os feitos de Héracles ecoam pelo tempo, especialmente as histórias de seus Doze Trabalhos, desafios estes que para Euristeu, rei de Tebas, nenhum homem seria capaz de realizá-lo. Héracles realizou os trabalhos por principalmente dois motivos, redenção e glória. Antes de ele aceitar as difíceis exigências do rei Euristeu, Héracles era casado com Mégara com que tivera três ou quatro filhos, depende da versão, porém desde cedo, Héracles era constantemente ameaçado pela raiva de Hera, a rainha dos deuses.
Hera tentou matar o herói quando este ainda era um bebê, enviando duas serpentes ao seu berço, porém a criança estrangulou as serpentes apenas com as mãos, um indicativo de sua futura força colossal. Anos depois já casado, Hera voltou a atormentá-lo, então causou-lhe um ataque de loucura, que o levou a matar a esposa e os próprios filhos, Héracles desconsolado e arrasado foi se queixar ao seu pai, sua revolta o fez se rebelar contra Zeus e os deuses, então Zeus disse que ele deveria se redimir de seu crime, controlar seu ego, domar sua arrogância, e sufocar seu orgulho. Ele deveria se tornar um herói (detalhe, até este fato propriamente acontecer, Héracles não havia realizado feitos heroicos).
Sem escolha, ele foi consultar o Oráculo de Delfos o qual lhe dissera para que se submetesse as ordens do rei Euristeu, seu primo. (Devo ressalvar que os deuses nem sempre eram favoráveis as súplicas humanas). Assim ele iniciara sua jornada através da Grécia, de partes da Europa, África e Ásia, além de navegar pelo Mediterrâneo e o Atlântico, em busca de realizar seus Doze Trabalhos, e posteriormente outras aventuras que viveu. Como Héracles realizou muitos feitos, falarei acerca de alguns poucos aqui.
Basicamente os Doze Trabalhos de Héracles consistiram em se matar ou capturar feras, de realizar serviços para outros reis, como foi o caso de ter que limpar os estábulos do rei Áugias e domar as éguas carnívoras do rei Diomedes. Além disso, outros de seus três trabalhos implicaram no fato de o herói ter que roubar, como foi o caso em ter que roubar os touros do gigante Gérion; roubar o Cinturão de Ares, o qual pertencia a Hipólita, rainha das amazonas; e roubar os pomos de ouro do Jardim das Hespérides. Hoje se um herói fizesse isso seria taxado de ladrão, mas para o contexto da época, isso implicava em grandes feitos, principalmente em relação ao Jardim das Hespérides, local onde apenas Héracles e Perseu chegaram a pisar, dentre os mortais conhecidos.
Se por um lado, Héracles tivera que atuar como herói, ele também atuou como justiceiro, participando de batalhas, matando inimigos, mas há dois momentos que são clássicos: o primeiro, diz respeito ao trabalho em ter que se domesticar as éguas carnívoras de Diomedes. Após ter realizado o feito, Héracles foi cobrar seu pagamento, Diomedes se negou a pagá-lo e a agradecê-lo, então Héracles jogou o rei as suas éguas, os quais o devoraram. Outro momento, de cunho semelhante, diz respeito quando Héracles foi solicitado pelo rei Laomedonte de Troia para salvar sua cidade do ataque de um monstro enviado por Poseidon, Laomedonte havia ofendido o deus, e oferecido uma de suas filhas como sacrifício para apaziguar a fúria do deus, contudo Héracles decidiu ajudar os troianos em troca de um pagamento. Héracles cobrou que o rei lhe oferecesse seus melhores cavalos, que diziam terem sido fecundados pelo deus do vento norte, Bóreas. O rei concordou, então o herói matou a fera, e quando retornou para pegar seu pagamento, o rei quebrou o acordou com ele. Héracles enfurecido matou Laomedonte e seus filhos, o único que foi poupado, era um jovem garoto chamado Príamo. Quanto as filhas, ele as filhas do rei, ele as vendeu como escravas.
Todavia, para encerrar este texto, por mais que o herói tenha realizado muitas outras façanhas dignas de serem mencionadas, falarei de como ele tivera seu fim "trágico". Héracles havia tomado como segunda esposa, a princesa Dejanira após disputá-la em um duelo, porém as constantes jornadas do herói, sua infidelidade (ele tivera vários filhos com distintas mulheres), prejudicou o casamento, até o ponto que o herói decidiu deixar Dejanira e se casar com Iole. Dejanira tentou convencer o marido a não deixá-la, então num dia os dois viajavam em companhia do centauro Nesso, ao chegarem em um rio, Héracles pediu que Nesso pusesse Dejanira em suas costas e atravessa-se o rio. Nesso aproveitou a ocasião e raptou a mulher. Enquanto fugia, foi atingido pelas flechas envenenadas de Héracles, mas antes de morrer, ele sabendo que Dejanira estava desesperada para não perder o seu marido, disse para ela que pegasse um pouco de seu sangue e o derramasse em uma túnica e desse para Héracles vestir, seu sangue era mágico e funcionaria como uma "poção do amor", a mulher convencida de que aquilo era verdade, fizera o que o centauro havia lhe dito.
Héracles saíra de casa usando a túnica ou capa embebida com o sangue envenenado do centauro, depois de um tempo, sua pele começou a arder e a queimar, a dor era tão grande que o herói começou a rasgar a própria pele com as unhas. Desesperado ele correrá até a casa do amigo Filoctetes, com o qual lhe deixara seus pertences, então acendera uma pira e se jogou dentro desta, em outras versões dizem que ele se jogou de um precipício. A morte era iminente, o fim trágico para o maior dos heróis gregos, ou não. Sua alma foi poupada por Zeus, o qual o fizera ascender ao Olimpo. Héracles ganhara a imortalidade, e passou a viver entre os deuses, se casando posteriormente com a deusa da juventude e sua meia-irmã, Hebe.
Os demais heróis iam para os Infernos ou Hades, como todos os outros mortais, porém no submundo havia um local para os heróis e para as almas bem-aventuradas, este local era chamado de Campos Elísios, uma espécie de "paraíso" para os gregos antigos. Na Odisseia, quando Odisseu desceu ao Inferno para encontrar o vidente Tirésias, ele acabou encontrando Aquiles, Agamemnon e outros guerreiros que lutaram na Guerra de Troia. Nesse caso, estes homens vagavam pelo inferno e não se encontravam nos Elísios. Pelo meu conhecimento sobre mitologia grega, Héracles foi o único herói que se tornara um deus, fato este que os antigos gregos construíram templos em sua homenagem, e oravam para ele.
No final, podemos dizer que os heróis gregos eram homens, semidivinos ou comuns, órfãos ou não, nobres, fortes, bravos, destemidos, sagazes, ambiciosos, orgulhosos, arrogantes, prepotentes, que mataram feras ou derrotaram poderosos guerreiros, que realizaram grandes feitos e grandes jornadas.
NOTA: Atena era a deusa da sabedoria, da guerra, padroeira de Atenas e protetora dos heróis, daí em muitos mitos ela sempre aparece dando conselhos aos heróis.
NOTA 2: Quíron era filho bastardo de Cronos com uma mortal, sua mãe o repudiou e o abandonou, o centauro fora criado e educado por Apolo. Quíron se tornou o mais sábio e respeitado entre os centauros. Ele foi mestre de heróis como, Aquiles, Pátrocolo, Héracles, Odisseu, Jasão, Teseu, etc. Quando Quíron morreu, ele foi transformado na Constelação de Sagitário.
NOTA 3: Castor e Pólux foram os grandes heróis de Esparta, eram filhos de Zeus e Leda, e eram irmãos também de Helena e Clitemnestra. Quando morreram, foram transformados na Constelação de Gêmeos.
NOTA 4: A Constelação de Héracles, era um motivo pelo qual os antigos gregos diziam que o herói passara a viver no céu entre os deuses.
NOTA 5: Jasão morreu anos depois, após ter sido atingido por um pedaço de seu próprio navio que lhe atravessou o coração.
NOTA 6: Pégaso e seu irmão o gigante Crisaor nasceram do sangue da Medusa, após Perseu ter cortado a cabeça desta.
NOTA 7: Alexandre, o Grande quando chegou a Ásia Menor, visitou as ruínas da cidade de Troia, onde fizera oferendas aos antigos heróis gregos. De fato, ele próprio se comparava a Aquiles e a Héracles.
NOTA 8: Os romanos diziam ser descendentes do herói troiano Eneias, logo eles se consideravam como descendentes dos troianos.
NOTA 9: Entre os bizantinos os poemas homéricos eram a literatura mais lida, sendo ensinada nas escolas, onde as crianças tinham que decorar e recitar versos de cada obra.
Referências Bibliográficas:BULFINCH, Thomas. O livro de ouro da mitologia: histórias de deuses e heróis. Tradução de David Jardim, Rio de Janeiro, Ediouro, 2006.
Grande Enciclopédia Larousse Cultural. v. 12, São Paulo, Nova Cultural, 1998. Grande Enciclopédia Larousse Cultural. v. 19, São Paulo, Nova Cultural, 1998.
Grande Enciclopédia Larousse Cultural. v. 4, São Paulo, Nova Cultural, 1998.
Grande Enciclopédia Larousse Cultural. v. 23, São Paulo, Nova Cultural, 1998
HOMERO, La Odisea. Barcelona, Obras Maestras, 1956. (a citação traduzida foi retirada das páginas 110, 111, 112, no capitulo IX).
HOMERO, La Iliada. Barcelona, Obras Maestras, 1959.
Referências audiovisuais:
History Channel. Confronto dos Deuses: Odisseu: A Maldição dos Mares (Clash of Gods: Odysseus: Curse of the Sea). [documentário-video]. EUA, 2009, 44 min, Color, Som.
History Channel. Confronto dos Deuses: Odisseu: A vingança do guerreiro (Clash of Gods: Odysseus: Warrior's Revenge). [documentário-video]. EUA, 2009, 44 min, Color, Som.
History Channel. Confronto dos Deuses: Hércules (Clash of Gods: Hercules).[documentário-video]. EUA, 2009, 44 min, Color, Som.
History Channel. Confronto dos Deuses: Minotauro (Clash of Gods: Minotaur). EUA, 2009, 44 min, Color, Som.
History Channel. Confronto dos Deuses: Medusa (Clash of Gods: Medusa). EUA, 2009, 44 min, Color, Som.
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As Constelações
Desde os tempos antigos os homens procuram compreender o cosmos, enxergam no negro véu os brilhantes pontos que resplandecem de um passado longínquo, e desde então, tentam decifrar seus enigmas e segredos. Entre diversas povos e culturas pelo...
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Momento: Expressões Da História - Parte Vi
O peso da culpa/ A pena da verdade É normal ouvirmos as pessoas falarem que a culpa é um fardo pesado, que pagaremos pela nossa culpa, que temos um peso a carregar. Mas, afinal, de onde vem tal expressão? Para se descobrir a origem desta velha expressão...
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Mitologia Grega: Nem Zeus Se Salva
Mitologia Grega: nem Zeus se salva As histórias parecem filme de terror. E os deuses do Olimpo estão mais para capeta que para santo Os gregos bem que poderiam ter sido roteiristas de filmes de terror. As histórias que cercam cada divindade, cada...
História do Brasil e do Mundo