História do Brasil e do Mundo
Igreja Católica e Revoltas Coloniais
Prof.º Leonardo Castro
Religião e Religiosidade no Brasil Colônia
Estado e Igreja foram as duas instituições que dirigiram a colonização da América espanhola e portuguesa a partir do século XVI. Para o Estado, a conquista material era vista como instrumento de acumulação de riqueza e poder. Para a Igreja, a conquista espiritual era instrumento de recomposição e ampliação do “rebanho” católico, reduzido e ameaçado na Europa pela ação da Reforma Protestante.
Frontispicio do livro História da guerra do reino do Brasil, do frei Gioseppe di Santa Teresa, 1698. Nesta imagem, a América indígena recebe a fé e a salvação cristã por meio do império português.
No Brasil, a Igreja implantou os serviços religiosos. Para os colonos, foram construídas as igrejas e capelas, criadas paróquias, colégios, irmandades e seminários, geralmente a cargo do clero secular (Bispos, Padres). Por esses serviços as autoridades eclesiásticas do reino exerciam seu controle sobre a vida religiosa, intelectual e moral de toda a sociedade colonial. Entre os instrumentos de controle, havia o Tribunal do Santo Ofício, a vigilância aterrorizante da Inquisição.
A inquisição enviava de vez em quando representantes seus à colônia. Eram os visitadores, agentes da fé para vigiar comportamentos dos luso-brasileiros e dar inicio a processos contra aqueles cujo comportamento considerassem condenáveis.
Primeira missa no Brasil. Vitor Meirelles, 1861. Museu Nacional de Belas Artes.
Com domínio das consciências, a Igreja moldou hábitos, valores, normas e costumes, combatendo o que considerava “desvios” de crença e de comportamento, reforçou o sentimento de lealdade e obediência ao soberano, fortalecendo com isso os vínculos entre colônia e metrópole.
A Companhia de Jesus foi a ordem religiosa que mais se destacou no Brasil colonial. Fundada em 1534 pelo espanhol Inácio de Loyola para ser uma organização religiosa de combate às “heresias” e aos “inimigos da fé”, a Companhia de Jesus incorporou o espírito da Contra-Reforma.
No Brasil, os jesuítas chegaram em 1549, na comitiva chefiada pela padre Manuel da Nóbrega. Nos séculos XVII e XVIII, os jesuítas mantinham igrejas, paróquias, colégios e missões desde Paranaguá (no atual estado do Paraná) até a região amazônica. Tanto por seu trabalho pastoral e missionário quanto pelo papel político que exerciam, os jesuítas tiveram forte presença na vida social e cultural da colônia. Foi na implantação das missões junto aos indígenas que os jesuítas mais se destacaram.
Assim, para os indígenas, foram organizadas as missões, também chamadas de “redução” ou “povos”. A cargo do clero regular (frades, monges), membros das ordens religiosas como franciscanos, capuchinhos carmelitas e jesuítas, as missões se espalharam por todo o Brasil.
A função das missões era reunir grupos nativos em aldeamentos, promover sua conversão e aculturação e evitar sua escravização. Os índios aldeados ou “reduzidos” eram considerados protegidos, ou “livres”. Nos aldeamentos, onde isolavam os índios, os missionários os catequizavam e faziam produzir.
Padre jesuíta Antônio Vieira em gravura que representa o padre convertendo índios na Amazônia.
Igreja de Santo Alexandre. Antiga Igreja e Escola dos jesuítas do século XVIII no Pará. Belém, Pará.
Religião oficial versus religiosidade popular
O catolicismo era a religião oficial do Brasil colônia. Os sinais da presença envolvente e dominadora da religião oficial estavam por toda parte: nas capelas, nas igrejas, mosteiros, colégios, seminários, orfanatos e hospitais construídos nas vilas e cidades; nas festas religiosas; nos registros paroquiais de batismo, casamento e óbito, que tinham valor de documentos oficiais.
A religião oficial mantinha a prática religiosa como elemento central da vida social e dirigia as consciências das pessoas, tanto no nível de crença (fé) quanto no do comportamento (moralidade).
A Igreja católica esforçou-se desde o início para controlar a aculturação religiosa dos índios e negros, para preservar a “pureza” da fé e do culto. Os índios eram educados nos aldeamentos e centros de catequese. Quanto aos negros, sobretudo a partir do século XVIII, puderam ter suas próprias irmandades – chamadas irmandades dos pretos, com igrejas dedicadas geralmente a Nossa Senhora do Rosário –, onde podiam, assistir à missa, celebrar casamentos e encomendar os mortos.
Os índios, entretanto, assim como os africanos e afro-brasileiros, promoveram resistência contra essa aculturação forçada e procuraram preservar suas tradições culturais e religiosas diante do culto oficial e dominante. A Igreja e as autoridades públicas reagiram duramente a essa resistência, como no caso da chamada Santidade de Jaguaripe, promovida por pajés (feiticeiros e rezadores) entre os índios tupis da Bahia no século XVI que usaram desta “santidade” como movimento para resistir à presença do colonizador português.
Quanto aos negros africanos e afro-brasileiros escravizados, misturavam suas crenças com as praticas religiosas recebidas dos padres, o que é chamado de sincretismo. Muitos grupos de origem africana deram a seus orixás nomes e imagens de origem católica, como aconteceu com Ogum, que passou a ser cultuado sob a forma de São Jorge, e Iemanjá, rainha do mar, que foi associada à Virgem Maria.
Alguns grupos de negros praticavam o ocotundá em Minas Gerais e o candomblé e o calundu no Nordeste, no século XVIII, que eram cerimônias religiosas e festivas em que os negros misturavam figuras e ritos católicos com rituais e danças africanos, considerados pela Igreja católica “pagãos”, “idolatras”, “diabólicos” e “luxuriosos”.
Acontundá – “Dança de tunda”, ritual praticado em Minas Gerais por negros escravos e forros no século XVIII.
Candomblé – Doutrina e culto afro-brasileiro que venera os orixás – entidades sobrenaturais; considerado ritual de feitiçaria pela Igreja.
Calundu – Ritual religiosos de origem jeje (etnia proveniente da costa ocidental da África), no qual há danças, cantos na língua jeje e são tocados vários instrumentos, como agogôs e atabaques.
Resistência na Colônia
A partir do século XVII, a convivência entre os portugueses que vinham do reino, os reinóis, e os luso-brasileiros nascidos na colônia, os mozambos, tornava-se cada vez mais difícil. Eles passaram a se defrontar como adversários na disputa por vantagens comerciais, prestígio e autonomia administrativa e política.
A Revolta dos Beckman no Maranhão, 1684.
Em 1682, Portugal criou a Companhia de Comércio do Estado do Maranhão para apoiar o desenvolvimento econômico do norte do Brasil, especialmente pelo incentivo à lavoura canavieira. Porém, ao invés de melhorar, a situação agravou-se. A economia, especialmente a agricultura exportadora, dependente da mão-de-obra escrava, desorganizou-se devido à dificuldade de obtenção de trabalhadores escravos através da Companhia de Comércio. Os proprietários, irritados e descontentes, reagiram contra a companhia.
Liderados pelos irmãos Manuel e Tomás Beckman, importantes donos de terras e de engenhos, os maranhenses rebelaram-se em São Luís a 24 de fevereiro de 1682. Assumiram o controle do governo e exigiram o fechamento da companhia.
Contudo a rebelião foi contida pelas autoridades do Estado do Maranhãos. Presos e julgados, os irmãos Beckman foram enforcados, enquanto outros líderes da rebelião eram condenados a prisão. Entretanto, a metrópole, reconhecendo os erros da companhia, foi obrigada a fechá-la, sendo extinta em 1685.
A Guerra dos Emboabas, 1708-1709.
A descoberta do ouro no atual estado de Minas Gerais, pelos bandeirantes paulistas no século XVII, desencadeou a vinda de milhares de pessoas para a região das minas, vindas de Portugal e outras capitanias. Os paulistas – que se proclamavam pioneiros na descoberta e com privilégio sobre as minas – encaravam as outras pessoas como rivais. Os paulistas chamavam essas pessoas de emboabas.
Em 1708, o português Manuel Nunes Viana, auto-intitulando-se governador das minas, à frente de outros emboabas, atacou e expulsou os paulistas do Arraial de Sabará. No ano seguinte, os paulistas contra-atacaram os emboabas na região do rio das Mortes. O governo do Rio de Janeiro teve que intervir para pacificar a região. Nunes Viana foi destituído de qualquer autoridade e, em 1709, foi criada a capitania de São Paulo e Minas do Ouro.
A Guerra dos Mascates, 1710-1712.
Em 1709, o governo português aprovou a elevação do Recife à categoria de vila. Tal decisão era muito esperada pelos comerciantes portugueses do Recife. Os senhores de engenho que moravam em Olinda não gostaram da medida. Eles eram rivais dos comerciantes, nos quais puseram o apelido de mascates.
Adquirindo autonomia político-administrativa e desvinculando-se de Olinda, os mascates, na maioria reinóis, consolidavam sua hegemonia sobre os mozambos, donos de engenhos, aos quais emprestavam dinheiro.
Julgando-se traídos pela Coroa, os olindenses reagiram. Em 1710, depois dos mascates terem erguido o pelourinho no Recife, os donos de engenho rebelaram-se. Forças da aristocracia olindense invadiram o Recife, derrubaram o pelourinho e puseram em fuga o governador. Em meados de 1711, os mascates retomaram a iniciativa de luta. A luta terminou em poucos meses com a intervenção do governo-geral da Bahia. O Recife conservou sua autonomia municipal.
A guerra dos guaranis, 1753-1756
Em meados do século XVIII ocorreu um dos mais importantes movimentos de resistência da história colonial: a recusa dos índios guaranis em obedecer à ordem de sair de suas terras durante a demarcação dos limites do território brasileiro imposto pelo Tratado de Madri (1750). Foi a chamada Guerra Guaranítica.
Pelo Tratado de Madri, acertado entre Portugal e Espanha em 1750, os portugueses tinham de sair em definitivo do rio da Prata. Para isso, era preciso que padres jesuítas e índios guaranis abandonassem a região. Entre os índios guaranis a reação foi a revolta. Para eles, a determinação implicava em prejuízos materiais, extinção de povoados e perda de autonomia.
Com o apoio dos padres missionários, armaram-se e se rebelaram contra a determinação. Portugueses e espanhóis enviaram tropas do Rio de Janeiro, Montevidéu e Buenos Aires para obrigar os índios a abandonar a região. Chefiados por Sepé Tiaraju e outros líderes, milhares de guaranis das missões sustentaram a luta. A morte de Sepé, em fevereiro de 1756, resultou no fim da guerra.
A Inconfidência Mineira, 1789.
Na segunda metade do século XVIII, a produção do ouro começou a declinar na região das minas. As dividas cresciam, a pobreza alastrou-se. Contudo, a metrópole aumentava sua pressão fiscal (cobrança de impostos) sobre os mineradores. A partir de 1750, os impostos atrasados deviam ser cobrados de vila em vila. Não sendo atingido o total devido, seria exigido um tributo que toda a população devia pagar. Esse imposto era chamado de derrama.
O Iluminismo
O século XVIII tem sido chamado de “Século das Luzes”. Esse nome derivou da palavra Iluminismo ou Ilustração, um movimento de idéias que varreu a Europa de ponta a ponta, pregando a supremacia da razão sobre a fé, a tolerância religiosa e política, o triunfo da liberdade e da democracia, a confiança no progresso, o fim do absolutismo.
Em 1788, o governador das Minas Gerais, visconde de Barbacena, anunciou para breve uma grande derrama. O anuncio aumentou a indignação da população. Há algum tempo já havia um grupo de intelectuais e outros membros da elite que se reunia secretamente para discutir a necessidade de libertar o país do jugo de Portugal. Na origem de seu pensamento estavam as idéias liberais propagadas na Europa pelos pensadores iluministas e o exemplo da Revolução Americana de 1776, que instaurou uma república na América do Norte, separando os Estados Unidos da Inglaterra.
O grupo era formado por membros das camadas superiores da sociedade mineira, eram militares, profissionais liberais, médicos, religiosos, advogados, etc. a única exceção era o alferes Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes.
Em seus encontros secretos, os inconfidentes traçaram seus planos: reunir homens e armas, depor o governo da capitania, aproveitando a revolta popular que viria com a definição da data da derrama; constituir uma República, à qual deveriam aderir as demais capitanias; promover o desenvolvimento industrial de Minas Gerais. Entretanto, os planos acabaram frustrados. Primeiro, pela delação de Joaquim Silvério dos Reis, um dos conjurados, que revelou ao governador os intentos do movimento em troca do perdão de suas dívida com a Fazenda Real.
O governador suspendeu a derrama e mandou prender os conjurados. Em 1789, todos os conjurados estavam presos. Tiradentes foi acusado como chefe da conspiração e condenado pelo crime de lesa-majestade, ou de alta traição ao Estado. Foi enforcado a 21 de abril de 1792. Mesmo fracassada, a Inconfidência Mineira reafirmava o espírito de resistência e contestação da sociedade colonial.
Texto complementar
“A coalizão de magnatas comprometidos com a revolução mineira não era monolítica, tendo na multiplicidade de motivações e de elementos envolvidos uma debilidade potencial. Os magnatas esperavam alcançar seus objetivos sob cobertura de um levante popular.”
(MAXWELL, Kenneth. A devassa da devassa.).
A Conjuração na Bahia, 1798.
A partir da década de 1790, na Bahia, grupos de pessoas, entre alguns proprietários, médicos, comerciantes, religiosos e, sobretudo, artesãos, oficiais de baixa patente, soldados e escravos negros, começaram a se reunir para debater sobre as novidades da Revolução Francesa e a revolta dos negros nos domínios franceses de São Domingos (Haiti). Discutiam as formas de aplicar na colônia as idéias revolucionárias das Luzes – os princípios de liberdade, igualdade, soberania e representação popular.
Sob forte influência da emancipação dos negros do Haiti, um dos objetivos do movimento era extinguir a escravidão no Brasil, o que dava-lhe seu caráter de revolução social.
Em 1798, foram divulgados em Salvador folhetos revolucionários. “Animai-vos Povo Baiense que está para chegar o tempo feliz da nossa liberdade, o tempo em que seremos todos iguais”, dizia um desses folhetos. Em resumo, esses folhetos proclamavam o fim do monopólio e da submissão a Portugal e o começo de uma nova era de liberdade, igualdade e felicidade.
Contudo as autoridades logo reagiram. Graças aos próprios folhetos escritos à mão, chegaram aos líderes do movimento. Feitas as prisões, logo foi desbaratada a conspiração.
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Guerra Dos Emboabas (1709)
Ocorreu em Minas Gerais e teve como causa a luta pela posse das minas entre paulistas e emboabas (forasteiros). Com a descoberta de ouro no Brasil, muitos portugueses e populações da orla litorânea, que estavam decadentes devido ao declínio da produção...
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