Gladiadores - Jogos Mortais
História do Brasil e do Mundo

Gladiadores - Jogos Mortais



Por sete séculos os jogos de gladiadores, ou lutas de gladiadores ou ludis gladiadorii como eram chamados na época, foram o esporte mais popular do mundo romano. Multidões de milhares de pessoas lotavam as arenas ou as ruas para verem estes homens se digladiando até a morte, lutando entre si ou contra feras. A carnificina e o derramamento de sangue gratuito eram o maior espetáculo da época, os eventos eram tratados a sério, durando semanas e até mesmo meses. No entanto as lutas de gladiadores iam além do puro entretenimento, havia outros interesses por trás das celebrações e realizações desses jogos mortais.

Origem e desenvolvimento:

O relato mais antigo sobre uma luta entre gladiadores data de 264 a.C, onde os filhos do senador Decimus Brutus Pera, organizaram no funeral de seu pai a luta de três pares de gladiadores. No entanto, a origem desse combate remonta os etruscos, povo que vivia ao norte de Roma na Etrúria. Não se sabe quando os romanos de fato adotaram a encenação de tais lutas, mais comumente os historiadores apontam o século III a.C como possível manifestação dessas lutas. 

Na época, os gladiadores eram bem diferentes do que comumente vemos em imagens mais tardias ou nos filmes. Os jogos se tornaram mais elaborados e grandiosos a partir da época imperial, criando-se regras e classes para os lutadores, mas nessa época, os lutadores se vestiam de forma bem comum, e usavam como arma o gládio (gladius), espada curta padrão das legiões romanas, foi a partir da palavra gladius que se originou o termo gladiador.

Mosaico romano retratando a luta entre Kalendio e Astyanax. Provavelmente eram as grandes estrelas do esporte na época. 
Inicialmente os gladiadores lutavam nas ruas, praças, quintais, etc., em celebrações religiosas, em funerais, banquetes e outros tipos de comemorações organizadas pelo Estado ou pelos patrícios. Os gladiadores eram em geral escravos, prisioneiros de guerra ou criminosos, os quais todos eram obrigados a servirem nos jogos, o chamado muneras (obrigação). Tais homens eram obrigados a lutarem nesses jogos, ou faziam isso ou seriam mortos, de qualquer forma, eles não tinham certeza se iriam sobreviver a próxima batalha, no entanto era preferível lutar e morrer do que ser morto por desistência. 

Em alguns casos houve homens livres que se sujeitaram a clientela (escravidão por dívida) para se tornarem gladiadores, pois diferente do que alguns pensam, os gladiadores recebiam prêmios em dinheiro. Nesse caso, os gladiadores mais famosos chegavam a receber boas quantias, o que os permitia em comprar sua liberdade, algo raro muitas vezes. No entanto, mesmo recebendo dinheiro pelas lutas, as condição de escravo era mantida e o usufruto desse dinheiro era mínimo, e em certa parte ele ficava retido com o dono do gladiador e em caso do gladiador morre-se o dinheiro que ele tinha guardado ficava para o seu senhor. 

Em 186 a.C se conhece os primeiros relatos acerca do venatio ou venationes, lutas de gladiadores contra animais. Nesse caso, as lutas encenavam caçadas, onde os gladiadores teriam que caçar e matar leões, leopardos e panteras inicialmente. Posteriormente foram incluídos outros animais nas realizações do venatio, como lobos, ursos, cervos, tigres, elefantes, rinocerontes, avestruzes, zebras, etc. Nessa época, as lutas já possuíam um caráter político e religioso, eram celebradas em datas religiosas e eram realizadas a fim de se obterem votos para os políticos, ou seja, algum rico político realizava tais jogos, oferecendo além das lutas, comida e vinho, assim as pessoas votariam nele, ou seria uma forma desse político esbanjar sua popularidade para outros membros da política.  
Mosaico romano representando gladiadores lutando contra animais.
"Os animais ferozes eram soltos na arena depois de terem sido mantidos em jejum e na obscuridade; sua morte tinha que ser espetacular, e em muitos casos havia uma espécie de corrida com touros ou rinocerontes, lutas entre animais e caçadas nas quais os animais perseguiam homens desarmados que, inevitavelmente, acabavam despedaçados. Muita atenção era dada à cenografia, que buscava recriar o ambiente natural das feras". (LIBERATI; BOURBON, 2005, p. 72).

Um gladiador montando em um cavalo, caçando um leopardo. Detalhe para a cenografia, onde se ver plantas e gramíneas. 
Havia venatios onde apenas os animais se confrontavam, em outros casos, fazia-se a apresentação de animais domesticados, algo visto nos circos, onde animais selvagens são domesticados para fazerem truques. Há relatos de sátiras dos venatios, onde anões caçariam coelhos e outros animais pequenos. Cavalos eram usados para facilitar a perseguição das feras; os animais também eram usados para se executar criminosos. 

No entanto, as lutas não se limitavam apenas a meros confrontos entre si e a caçada de animais, as lutas em alguns casos representavam encenações de batalhas históricas, de mitos, de peças de teatro, etc. Os gladiadores encenavam batalhas históricas, onde um grupo se vestiam como os legionários e outro como os bárbaros conquistados; encenavam a Guerra de Troia, mas nesse caso os romanos eram a favor da vitória dos troianos; encenavam peças especialmente tragédias, onde de fato as personagens que morriam na história, eram realmente executados. Havia apresentação de malabaristas, acrobatas, dançarinas, ilusionistas, etc., geralmente tais tipos de apresentações se davam nos intervalos até a próxima atração, afinal era um espetáculo. 

"Também eram muito apreciados as evocações de episódios místicos ou históricos e as montagens de contos populares, como o do bandido que, depois de cometer todo tipo de crimes, era preso e crucificado ou despedaçado por um urso. Tudo isso acontecia de verdade sem qualquer ficção". (LIBERATI; BOURBON, 2005, p. 72).

No final do século II a.C os jogos de gladiadores já haviam se tornado populares, e passaram a serem realizados em arenas, os estádios da época. Escolas de gladiadores eram criadas para treinarem os lutadores na arte da guerra, para servirem a um único propósito, entreter o público. Tais escolas eram chamadas de lunas ou ludus, e poderiam pertencer a particulares ou ao Estado. O dono dessas escolas era geralmente chamado de lanista. O maior ludus que houve na história romana, foi o Ludus Magnus construído em Roma ao lado do Coliseu. A escola foi construída a mando do imperador Domiciano entre os anos de 81 a 96. 


Reconstituição do Ludus Magnus em Roma. 
"Os gladiadores eram propriedades de um 'empresário' - o lanista - que pagava do seu bolso o treinamento e o equipamento necessários. As armas e os equipamentos de proteção frequentemente tinham adornos luxuosos. Os gladiadores se reuniam em organizações chamadas familiae, que viviam em alojamentos especiais muito semelhantes a prisões". (LIBERATI; BOURBON, 2005, p. 74).


Desenho romano retratando lutas entre gladiadores. Nota-se o nome deles em destaque.
Não obstante, por volta do século II a.C e I a.C surgiu a política do Pão e Circo (panem et circenses), onde o Estado ou particulares promoviam jogos não apenas para ganhar voto nas eleições e aumentar sua popularidade entre a plebe, mas como forma de amenizar os tumultos e o descontentamento da população em períodos de crise. Assim, era oferecido ao povo, entretenimento, pão e vinho, as pessoas encheriam a barriga e se entreteriam, esquecendo os problemas. Porém, tal política acarretou em enormes gastos ao governo. Mesmo assim, alguns imperadores adotaram tal política em alguns momentos de seu governo.

Em 73 a.C uma revolta de escravos iniciada no ludus (escola) de gladiadores de Quintus Lentulus Batiatus em Cápua, eclodiria na Terceira Guerra Servil, a maior revolta de escravos da história romana. A revolta foi liderada pelo mais famoso gladiador conhecido, chamado de Espártaco (120-70 a.C), o qual liderou a rebelião na escola de Batiatus e promoveu a fuga de alguns gladiadores, eles fugiram, se esconderam das tropas, e depois começaram a unir seguidores para um ideal comum, libertar-se da escravidão dos romanos, e lutar para libertar outros escravos. Espártaco era um prisioneiro de guerra, possivelmente um soldado trácio. Seu nome verdadeiro é desconhecido, pois Espártaco (Spartacus) era o nome de um valente rei trácio, o qual os romanos equiparam ao gladiador por sua bravura e rebeldia.

Estátua de Espártaco por Denis Foyatier, 1830.
Pelos três anos seguintes, Espártaco chegou a reunir pelo menos 80 mil pessoas, entre escravos, libertos (ex-escravos) e homens livres, dentro destes 80 mil, haviam mulheres, crianças e idosos, e parte deste contingente servia como exército rebelde da causa. A revolta durou três anos até ser eliminada em 70 a.C pelas legiões dos generais Crasso e Pompeu. Espártaco foi morto no campo de batalha e seu corpo foi desfigurado, como apontam alguns relatos. Crasso posteriormente ordenou que 5 mil escravos rebeldes que foram capturados após a morte de Espártaco, fossem crucificados ao longo da Via Ápia, principal estrada de acesso a Roma. Os condenados jazeriam ali para morrer de fome e sede.


Em 63 a.C o político, filósofo, escritor, advogado, orador, Cícero (106-43 a.C), promoveu um projeto de lei para proibir a realização das muneras antes do período das eleições e reduzir a política do Pão e Circo. No entanto o Senado considerou desnecessária a proposta de Cícero e o projeto foi rejeitado. 

"Quando a o sistema imperial se consolidou, os eventos se ampliaram. Foi o primeiro imperador, Augusto (27 a.C - 14 d.C), que executou medidas para que as lutas durassem o dia todo, com direito a disputas com feras selvagens e muita morte nas arenas. [...]. Durante o reinado de Augusto, rigorosas regras foram criadas a respeito dos jogos cênicos. O objetivo era, acima de tudo, garantir que os eventos proporcionados por ele fossem os mais extravagantes do império. E, assim, por volta do ano de 22 a.C, os espetáculos já estavam quase que totalmente sob o controle do imperador". (WILLMOT, 2009, p. 15). 

Os jogos se seguiram pomposos e grandiosos pelos quatro imperadores que sucederam César AugustoTibério, Calígula, Cláudio e Nero, no entanto durante a segunda metade do governo de Nero, as finanças do império entraram em crise, e o mesmo acabou cometendo suicídio já que havia descoberto um golpe de Estado, planejado pelos senadores. O período que se sucedeu foi conturbado, tendo em um ano, quatro imperadores que assumiram o trono e foram derrubados por seus concorrentes, até que ainda em 69 a.C, Vespasiano, o quinto concorrente saiu vitorioso e se firmou no poder. Vespasiano propôs um ousado projeto para se promover: construir a maior arena que o mundo romano já vira. 

Em 72 a.C começou a construção do Anfiteatro Flaviano nome dado em homenagem a Dinastia Flaviana inaugurada por Vespasiano. O anfiteatro começou a ser construído sobre o Palácio Dourado de Nero, o qual foi derrubado para dá espaço para a monumental construção, no entanto as bases e fundações do palácio ainda podem ser vistas hoje em dia, embora não seja algo de acesso aos turistas. O anfiteatro ficaria mais conhecido na História pelo nome de Coliseu, devido ao fato de que nas proximidades ficava uma imponente estátua do imperador Nero, posteriormente derrubada.

"Gigantesco, o anfiteatro, que é uma elipse de 188 por 156 metros e possui 49 metros de altura, foi criado com o propósito de receber um assombroso número de pessoas, algo em torno de 50 mil. Era o símbolo em pedra do poder da Dinastia Flaviana". (WILLMOTE, 2009, p. 16).


Desenho representando o Coliseu nos tempos antigos. 
"Este prédio é um verdadeiro prodígio de organização e uma maravilha arquitetônica, em especial quando se leva em consideração suas dimensões: 50 metros de altura por 188 de diâmetro; tinha capacidade para entre 50 e 70 mil espectadores. Calcula-se que, no total, foram utilizados 100 mil metros cúbicos de travertino, 6 mil toneladas de cimento e 300 de ferro para as pinças que unem os blocos". (LIBERATI; BOURBON, 2005, p. 72).

"O Coliseu é composto de oitenta muros radiais que convergem do anel externo para o interior, que sustentavam a grande cávea de blocos de galerias e escadarias que permitia ao público deixar o gigantesco edifício em poucos minutos". (LIBERATI; BOURBON, 2005, p. 73).

Para proteger a plateia do calor do sol, enormes toldos eram estendidos na última fileira, puxados por um grupo de marinheiros treinados para mover o sistema de cordas e polias para movimentar o toldo. 

Imperador Vespasiano
Vespasiano não viveu tempo o bastante para ver a inauguração de sua monumental obra. O imperador morreu em 79 a.C a poucos meses da inauguração do anfiteatro. Com sua morte, seu filho e sucessor, Tito Flávio, inaugurou o Coliseu, realizando uma celebração de cem dias de jogos. Relatos apontam que milhares de gladiadores e animais morreram nestes pouco mais de três meses de espetáculo sangrento. O Coliseu não apenas impressionava com suas dimensões, mais também pelo fato de que a mais avançada tecnologia na época foi utilizada para engrandecer os jogos. Sob a arena existiam alçapões por onde gladiadores, funcionários e animais surgiam no meio da batalha, como se fosse um fator surpresa, algo que já tinha sido visto em outros lugares, mas de forma mais imponente aqui. Sob o Coliseu existiam vários túneis, por onde ligavam diferentes partes do complexo, onde os gladiadores se movimentavam para tomar lugar na arena acima, onde os animais eram conduzidos de suas jaulas por elevadores para surgir no meio da arena, e até mesmo existem canais, por onde água era bombeada para que a arena fosse inundada e batalhas navais fossem travadas. 

As batalhas navais eram chamadas de naumaquias, e houveram alguns imperadores como Augusto (63 a.C - 14 d.C) Domiciano (51-96) que investiram na construção de uma arena específica para a encenação de naumaquias. De fato a palavra naumaquia também era usada para se referir ao local onde esse espetáculo era apresentado. Barcos e navios eram levados para essa arena, onde se encenavam os confrontos navais. Em alguns casos como a naumaquia realizada pelo imperador Cláudio (10 a.C - 54 d.C) no ano de 52, essa ocorreu no lago Fucino

"Ficou famosa a naumaquia que Augusto mandou cavar em Trastevere. Tinha 536 metros de comprimento e 357 de largura, era alimentada por um aqueduto especial, o Alsietino, e foi inaugurada com um espetáculo que teve a participação de três mil combatentes, sem contar a tripulação das naus". (LIBERATI; BOURBON, 2005, p. 78).

A naumaquia realizada pelo imperador César Augusto foi inspirada na naumaquia realizada pelo seu tio-avô, Júlio César no ano de 46 a.C. Os gladiadores que lutavam nesse evento eram chamados de naumachiarii, e possuíam roupas e armas diferentes dos jogos normais, pois aqui era um outro estilo de combate. 


Representação de uma naumaquia no Coliseu. Kuhn, 1919. 
Os patrícios sentavam-se nas primeiras fileiras, e a plebe se sentava nas fileiras restantes até o topo. Em dias de muito calor, toldos eram estendidos para proteger do sol. Existia uma espécie de camarote apenas para gente ilustre como políticos, generais, ricos lanistas, e a próprio imperador e seus convidados especiais. Nesse caso, tanto homens e mulheres compartilhavam esses camarote. 

No caso do Coliseu devido a suas dimensões, nos corredores em torno das arquibancadas e nas entradas, se amontoavam os mais variados tipos de pessoas: comerciantes, apostadores, cafetões, prostitutas, jogadores, trapaceiros, ladrões, etc. Em outras arenas de menor porte, também se via esse tipo e comércio e pessoas nas ruas nos arredores da arena, já que se não havia espaço no prédio, as pessoas ficavam na rua mesmo, onde se encontrava lojas, casas de jogo, tavernas, prostíbulos, etc. Os jogos eram um grande espetáculo e uma oportunidade de se fazer dinheiro, já que pelo menos 50 mil pessoas estariam concentradas por ali a cada dia de jogo. Logo, temos notícias de pessoas que apostavam nos gladiadores ou nas equipes. 

Com a popularização dos jogos durante o império, senhores de outras províncias romanas inicialmente na Itália, começaram a promover a construção de anfiteatros para a realização dos jogos, tal propósito se dava como forma de enaltecer sua imagem localmente e diante do senado e do imperador. Anfiteatros foram construídos em todos os cantos do império, da Bretanha ao Egito. Não obstante, os antigos anfiteatros e estádios gregos, foram adaptados para realizarem os jogos, já que algumas cidades orientais já possuíam tais construções, advindas desde a época de Alexandre e até mesmo antes dele. 

Decadência: 

Os jogos foram populares por cerca de 300 anos ao longo do império, até que durante o reinado (306-337) do imperador Constantino, o Grande este decidiu abolir os jogos. Constantino havia se tornado o primeiro imperador romano a adotar o Cristianismo como religião pessoal, sendo assim o violento espetáculo não condizia com a imagem cristã que Constantino estava tentando impor ao império, dessa forma o imperador aboliu os jogos, no entanto eles ainda continuaram a serem realizados pelo menos por quase cem anos, até que no século V d.C, os jogos foram abolidos de vez, tendo dessa vez a influência da Igreja sobre o veredicto. Os últimos relatos conhecidos sobre a realização dos jogos datam do governo do imperador Honório, o qual governou de 393 a 423.

Nessa época o império romano estava em decadência, e manter os gastos com os jogos era algo inviável, e não obstante, o Cristianismo já havia se tornado religião oficial do império em 393 quando o pai de Honório, o imperador Teodósio, o Grande ditou que o Cristianismo seria a religião oficial do império e aboliu as visitas aos templos pagãos e as celebrações de festejos e cerimônias pagãs. Nesse caso, até mesmo os Jogos Olímpicos foram proibidos, pelo fato de serem realizados em honra de Zeus

Com a queda de Roma em 476, os ditos Reis Bárbaros assim como os romanos os chamavam, não aderiram aos jogos, o Império Bizantino, sucessor dos romanos, por serem um poderoso império cristão, também aboliram a prática de tais atos de violência, embora que houvessem execuções públicas, com animais devorando os condenados, mas de qualquer forma, o novo esporte dos bizantinos eram as corridas de bigas, que já existiam entre os romanos. Com isso, o espetáculo sangrento dos gladiadores chegou ao fim após quase sete séculos de derramamento de sangue. 

Classes de gladiadores:

Durante o império, os jogos sofreram reformulações em suas regras e várias classes de combatentes foram criadas para tornar as lutas mais cênicas, a final as lutas não eram apenas matança pura, teria que haver um pouco de "atuação". Nesse caso falarei um pouco das principais classes de gladiadores, já que houveram mais de vinte classes, sendo que algumas existiram apenas durante a República ou Império, e outras coexistiram em ambos os períodos mas foram abolidas gradativamente.

Retiarius: Literalmente "homem-rede", era uma classe na qual suas armas eram um tridente, uma faca e uma rede. O retiarius poderia usar a rede para prender o oponente ou distraí-lo para que pudesse lhe estocar com seu tridente. 
Mosaico retratando uma luta entre um retiarius (direita) contra um secutor.
Secutor: O secutor (perseguidor) era o adversário específico do retiarius, só poderia entrar em combate contra o mesmo. O secutor, usava protetores nas pernas e no braço direito, e portava um grande escudo retangular, como o utilizado pelos legionários. Suas armas eram o gládio ou um punhal. O mesmo usava um pesado capacete sem pontas e com viseira. 

Mirmillo: Seu nome advêm da forma de seu capacete, o qual lembrava o formato de um peixe (murma). Usava um escudo retangular e espada, era o oponente do retiarius ou do trácio

Trácio (thraces): O nome se deve ao fato de que o lutador se vestia parecido a um guerreiro da Trácia, inimigos dos romanos de longa data. O trácio usava um capacete, um escudo pequeno e usava uma espada curta. Usava protetor no braço direito e caneleiras. 

Hoplomachus: Usava um gládio como arma, além de se proteger com um capacete ornamentado com a imagem de um grifo, um peitoral, e faixas de couro nos pulsos e caneleiras. 


No mosaico estão retratados na esquerda e na direita um mirmillo e um trácio, e ao centro  dois hoplomachus.
Equites: Os equites lutavam à cavalo, usando um escudo redondo, uma lança, um capacete e uma túnica. Apenas lutavam contra outros de sua classe. 

Dimachaeri: Literalmente "homem de duas facas", lutava empunhando duas espadas curtas. 

Andabatae: Outra classe de gladiador cavaleiro, lutava montado e usava um capacete que lhe dificultava a visão. Usava uma lança como arma, e combatia apenas outros gladiadores cavaleiros. 

Naumachiarii: Gladiadores que combatiam nas naumaquias. 

Bestiarii: Gladiadores que lutavam nas venatios, onde confrontavam ou caçavam animais. 

Mulheres gladiadoras:

As gladiadoras ou amazonas como também eram chamadas, eram escravas ou prisioneiras comuns, forçadas a receber o treinamento de luta para atuarem nas arenas assim como os homens. Nesse caso, as mulheres usavam as mesmas vestimentas dos homens dependendo da classe que atuaria, e no caso delas, elas não lutavam em todas as classes. Geralmente as mulheres lutavam entre si, porém poderiam lutar contra os homens e as feras. 


Relevo representando duas gladiadoras, Amazonia e Achillea.
Havia certas especificações em algumas lutas entre mulheres e homens, nesse caso, existia uma luta onda uma gladiadora lutava contra dois gladiadores, mas nesse caso, os dois homens tinham um dos braços amarrados nas costas, a fim de dar vantagem a gladiadora. Não obstante, pelo fato dos gladiadores com exceção dos cavaleiros que usavam túnicas, os demais usavam muita pouca roupa e proteção, o mesmo valia para as mulheres, as quais lutavam seminuas, e em alguns casos, lutavam com os seios a mostra. 


Cartão postal retratando uma luta encenada entre duas gladiadoras. 
A participação das mulheres não foi algo comum, existem poucos relatos acerca de suas atuações nas arenas, já que muitos não concordavam que mulheres fizessem parte dos jogos, e houveram até leis que proibiram a participação delas nos jogos. 

Outros tipos de pessoas:

Alguns imperadores possuíam gostos bem estranhos, Calígula e Domiciano gostavam de ver lutas de gladiadoras e de anões, os anões eram postos para lutar como forma de deixar mais "cômico" as batalhas, eles tanto lutavam entre si ou com os demais gladiadores e até com animais. 

Não obstante, Calígula e outros imperadores, também gostavam de verem velhos lutando e até mesmo aleijados, algo que eles achavam engraçado. Já Nero, durante os intervalos das lutas, promovia a execução de alguns prisioneiros, jogando aos leões, os quais massacravam os pobres condenados indefesos. Outros imperadores romanos e até bizantinos também fizeram o mesmo, pois a arena era um local comum para execuções de criminosos e traidores. 

Não obstante, alguns imperadores chegaram até mesmo a atuarem como gladiadores como foi o caso de Caracala, Calígula, Adriano Tito, entre outros; contudo, talvez o imperador Cômodo (161-192), o qual chegara até mesmo a se vestir como Héracles (Hércules) para participar das lutas. Cômodo acabou sendo morto por um gladiador chamado Narciso, que com a ajuda de uma das amantes de Cômodo, o estrangulou enquanto ele tomava banho. 

Animais

Desde 186 a.C há relatos das venatios, ou sejam as caçadas, onde os gladiadores combatiam feras. Mas a medida que o espetáculo foi se tornando mais grandioso algumas regras surgiram, dentre estas o surgimento da classe bestiarii (bestiarius no plural). Os bestiarius eram propriamente os gladiadores que lutavam com tais feras, se valendo de escudos, lanças, arcos e flechas, cavalos, etc. Os bestiarius combatiam leões, panteras, leopardos, ursos, lobos, tigres, elefantes e até mesmo caçavam gazelas, corças, javalis e outros tipos de animais, afinal, as venates representavam caçadas. 


Mosaico romano de Constantinopla, retratando dois bestiarius lutando contra um tigre.
No entanto, algumas lutas em que os bestiarius participavam não possuíam o intuito da caçada, mas sim da execução pelos animais, dessa forma, em muitos casos as chances de sobrevivência eram bem menores para eles.

Não obstante, a luta contra animais além de ser um particular a mais na atração, já que as pessoas se maravilhavam com aquelas feras, era uma forma também do Estado mostrar o quão poderoso e vasto eram seus domínios. As pessoas ficavam sabendo que na época do império, seus domínios cobriam o Norte da África e parte da Ásia, mas não tinham noção das distâncias, e quando viam nas arenas elefantes e tigres e outros tipos de animais, ouviam que tais animais vinham destas terras, logo sabiam que o império realmente era grande. 

Além do uso de animais, usava-se gladiadores de distintos cantos do império os exibindo como "espécimes" destes locais. Assim tivemos gladiadores de origem germana, gaulesa, bretã, hispânica, númida, egípcia, grega, etíope, judia, parta, etc. 

A vida de gladiador

A vida de gladiador era uma das piores que podia se ter, embora que o mesmo pudesse se tornar famoso, um ídolo, como foi testemunhado na época. Alguns gladiadores que se tornavam ídolos, tinham seus nomes grafados em paredes, pelos seus fãs, que escreviam até frases de exaltação, havia casos em que se vendiam plaquetas com desenhos os retratando, como se fosse uma espécie de souvenir. Alguns gladiadores chegaram a ter estátuas. Houveram casos que alguns gladiadores famosos foram assediados por mulheres ricas ou até mesmo por homens, os quais pagavam para se encontrar com estes e terem relações sexuais.

Mas em geral, a vida deles era degradante, passavam horas treinando, viviam nos alojamentos das escolas, esperando até a próxima luta, enquanto isso ajudavam nos serviços locais. Só poderiam deixar o lanus sob autorização do seu senhor, mas em geral a vida deles resumia-se do lanus a arena. Eram escravos do Estado ou de particulares, como políticos, mercadores, fazendeiros, etc. No caso dos escravos indisciplinados, estes recebiam serviços de correção, ou seja, eram castigados por sua indisciplina ou afronta aos professores ou  qualquer membro da família de seu dominus (senhor), ou alguma visita. 

Mas, mesmo que fossem castigados, evitava-se que os castigos fossem muito severos, para não feri-los gravemente, pois comprar um bom escravo para se tornar um gladiador era algo caro, além disso havia todo o investimento feito em seu treinamento. Colocar tudo a perder por causa de umas chicotadas, era uma loucura. Além disso, sabe-se que todos os gladiadores possuíam acesso a médicos, os quais tentavam curá-los a todo o custo para evitar o prejuízo financeiro da sua perda, pois a ideia do lanista era manter seus gladiadores o máximo de tempo vivos, e assim lhe rendendo lucro e fama pelas vitórias. 

Viviam em alojamentos simples chamados familiae, como já mencionado e tinham uma refeição razoável para ajudar na nutrição, a fim que estivessem aptos para lutar. Diferente do que pensamos, os gladiadores não eram tão musculosos como vemos nos filmes, seriados e jogos, na realidade eles eram robustos, e embora possuíssem um corpo atlético, mas não nos padrões de hoje. A alimentação dos gladiadores era predominantemente vegetariana, pois consumir carne regularmente era algo caro, apenas acessível as elites, mas em alguns casos eles comiam carne. 

A base da alimentação dos gladiadores era um tipo de feijão, somada a algumas frutas, e uma espécie de mingau de cevada, aveia ou trigo. Comiam pão e queijo, bebiam leite e cerveja, além de receberem algumas misturas que funcionariam como complemento alimentar.

Em alguns lugares, os gladiadores tinham direito a prostitutas (alguns eram homossexuais e tinham relações com seus companheiros). A questão de se constituir família não era algo permitido no lanus, os gladiadores que foram capturados, na maioria dos casos nunca mais voltavam a ver sua esposa, filhos e demais familiares. 

Acerca da liberdade, como vimos, havia casos de gladiadores conseguirem comprar sua liberdade ou ganhá-la como recompensa. Alguns gladiadores que estavam tão habituados as lutas, preferiam se tornar professores ou instrutores no lanus do que ir embora. Outros que ganhavam a liberdade passavam a ir trabalhar em outros ofícios e a constituir família, mas havia casos, de que eles acabavam voltando a ser gladiadores, pois não encontravam trabalho. Um gladiador quando recebia a liberdade, ele ganhava um gládio de madeira chamado rudis, como símbolo de sua alforria. O qual trazia grafado o nome dos gladiadores que ele matou em batalhas importantes, frases honoríficas, etc., uma forma de exaltar seus feitos na arena. Em geral, os gladiadores não conseguiam conquistar a liberdade e morriam na arena. 


Representação de um rudis no seriado Spartacus
A glória conseguida nos jogos era apenas um momento, já que na luta seguinte ele poderia está morto. Diferente da glória alcançada em uma guerra, onde você poderia voltar para casa triunfante e desfrutar de seu sucesso até que a próxima guerra viesse acontecer. 
Encenação moderna da luta entre dois gladiadores.
Dedo para cima ou dedo para baixo?

Nos filmes de gladiadores, ficou marcado o sinal do polegar para cima indicando que o condenado fosse poupado, e o polegar para baixo, indicando que o condenado deveria ser executado, na realidade isso não era bem assim.


Pintura retratando um gladiador aguardando o sinal para executar o derrotado.
Diferente do que vemos em alguns filmes, seriados e jogos, necessariamente nas lutas não haviam degolamentos ou decapitação de braços ou pernas. Claro que uma vez ou outra isso acontecia, mas em geral, os jogos prezavam a "encenação", assim os gladiadores necessariamente não matavam de imediato seu oponente, mas iam o ferindo, o enfraquecendo, até que o matavam ou o faziam render-se para dá o golpe de misericórdia. 

O golpe de execução poderia ser lhe cortar a garganta, ou mais comumente como eles faziam, era por o derrotado de joelhos, e cravar sua espada na clavícula dele. O sinal de execução com o polegar necessariamente não era utilizado normalmente, as pessoas gritavam para que o derrotado fosse poupado ou executado, e quando a autoridade política ou o imperador decidia fazer o simbólico sinal, ele poderia na verdade quando estivesse com o polegar levantado, querendo dizer que "pode executá-lo", já que simbolicamente o polegar levantado e os demais dedos fechados simboliza algo bom ou que você esteja pedindo que algo seja executado. 

NOTA: Os gladiadores foram temas de filmes, seriados, livros, novelas, desenhos, jogos, etc. Nesse caso os filmes mais famosos são: Spartacus (1960) e Gladiador (2000). Ambos ganharam alguns Oscar. 
NOTA 2: Recentemente temos um seriado focando a história de Espártaco e de outros gladiadores fictícios, as temporadas Spartacus: Blood and Sand, Spartacus: Gods of the Arena, Spartacus: Vengeance e Spartacus: War and Damned. As duas primeiras temporadas dão um maior foco as lutas de gladiadores e ao lanus, já as outras duas temporadas focam a rebelião iniciada por Espártaco. 
NOTA 3: O super-herói da DC Comics, Booster Gold é comumente conhecido no Brasil como Gladiador Dourado.
NOTA 4: A Marvel Comics possui uma super-heroína chamada Gladiatrix, ou em português, Gladiadora. 
NOTA 5: Gladiadora é o nome de um tipo de sandália, a qual era utilizada de fato pelos gladiadores e gladiadoras. Hoje, são as mulheres que usam comumente esse tipo de sandália com faixas que sobem pela perna. 
NOTA 6: Alguns jogos de videogame que tratam a respeito da luta de gladiadores são: Shadow of Rome (2005), Colosseum: Road to Freedom (2005) e Gladiator: Sword of Vengeance (2003), todos estes jogos são para PS2. Spartacus Legends (2013) baseado na série Spartacus, disponível para PS3 e Xbox 360. 

No entanto, existem outros jogos do gênero.
NOTA 7: No filme Gladiador (2000), são retratados os imperadores Marco Aurélio e seu filho Cômodo. Na História, Cômodo fora assassinado por um gladiador e tal fato é utilizado no filme, onde a personagem Maximus (Russel Crowe) mata o imperador. 
NOTA 8: Nas execuções de criminosos realizadas nas arenas, era comum os gladiadores serem os carrascos. 

Referências Bibliográficas:
WILLMOTT, Tony. Gladiadores: feras em combate. Tradução de Amanda Nero, Revista BBC História, vol. 3, São Paulo, Tríada, 2009. pp. 12-19. 
LIBERATI, Anna Maria; BOURBON, Fabio. A Roma Antiga. Tradução Alexandre Martins. Barcelona, Ediciones Folio S. A, 2005. 





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