História do Brasil e do Mundo
A Revolução Industrial
Prof. Leonardo Castro
A Revolução Industrial consistiu em um conjunto de mudanças tecnológicas com profundo impacto no processo produtivo em nível econômico e social. Iniciada na Inglaterra em meados do século XVIII, expandiu-se pelo mundo a partir do século XIX.
Ao longo do processo (que de acordo com alguns autores se registra até aos nossos dias), a era agrícola foi superada, a máquina foi suplantando o trabalho humano, uma nova relação entre capital e trabalho se impôs, novas relações entre nações se estabeleceram e surgiu o fenômeno da cultura de massa, entre outros eventos.
Essa transformação foi possível devido a uma combinação de fatores, como o liberalismo econômico, a acumulação de capital e uma série de invenções, tais como o motor a vapor. O capitalismo tornou-se o sistema econômico vigente.
Antes da Revolução Industrial, a atividade produtiva era artesanal e manual (daí o termo manufatura), no máximo com o emprego de algumas máquinas simples. Dependendo da escala, grupos de artesãos podiam se organizar e dividir algumas etapas do processo, mas muitas vezes um mesmo artesão cuidava de todo o processo, desde a obtenção da matéria-prima até à comercialização do produto final. Esses trabalhos eram realizados em oficinas nas casas dos próprios artesãos e os profissionais da época dominavam muitas (se não todas) etapas do processo produtivo.
Com a Revolução Industrial os trabalhadores perderam o controle do processo produtivo, uma vez que passaram a trabalhar para um patrão (na qualidade de empregados ou operários), perdendo a posse da matéria-prima, do produto final e do lucro. Esses trabalhadores passaram a controlar máquinas que pertenciam aos donos dos meios de produção os quais passaram a receber todos os lucros. O trabalho realizado com as máquinas ficou conhecido por maquinofatura.
Com a evolução do processo, no plano das Relações Internacionais, o século XIX foi marcado pela hegemonia mundial britânica, um período de acelerado progresso econômico-tecnológico, de expansão colonialista e das primeiras lutas e conquistas dos trabalhadores. Durante a maior parte do período, o trono britânico foi ocupado pela rainha Vitória (1837-1901), razão pela qual é denominado como Era Vitoriana. Ao final do período, a busca por novas áreas para colonizar e descarregar os produtos maciçamente produzidos pela Revolução Industrial produziu uma acirrada disputa entre as potências industrializadas, causando diversos conflitos e um crescente espírito armamentista que culminou, mais tarde, na eclosão, da Primeira Guerra Mundial (1914).
Era Vitoriana - o triunfo do vapor e da eletricidade. Painel do periódico Noticias Ilustradas de Londres, 1897.
O pioneirismo da Grã-Bretanha
Pela aplicação de uma política econômica liberal desde meados do século XVIII. Antes da liberalização econômica, as atividades industriais e comerciais estavam cartelizadas pelo rígido sistema de guildas, razão pela qual a entrada de novos competidores e a inovação tecnológica eram muito limitados. Com a liberalização da indústria e do comércio ocorreu um enorme progresso tecnológico e um grande aumento da produtividade em um curto espaço de tempo.
A Grã-Bretanha possuía grandes reservas de ferro e de carvão mineral em seu subsolo, principais matérias-primas utilizadas neste período. Dispunham de mão-de-obra em abundância desde a Lei dos Cercamentos de Terras, que provocou o êxodo rural.
A política dos cercamentos de terras foi fruto do contexto comercial do século XVIII, na Inglaterra. Consistia na transformação das terras comuns aos senhores e servos, provenientes da antiga relação feudo-vassálica, em pastos para as ovelhas. A lã era, junto com o carvão e o ferro, um dos pilares da expansão comercial inglesa. Os servos, sem possuirem terras para conseguirem seu sustento, foram forçados a migrar para as zonas urbanas em busca de trabalho, tornando-se mão-de-obra barata e constituindo uma nova classe, o proletariado.
A burguesia inglesa tinha capital suficiente para financiar as fábricas, adquirir matérias-primas e máquinas e contratar empregados.
O motor a vapor
As primeiras máquinas a vapor foram construídas na Inglaterra durante o século XVIII. Retiravam a água acumulada nas minas de ferro e de carvão e fabricavam tecidos. Graças a essas máquinas, a produção de mercadorias aumentou muito. E os lucros dos burgueses donos de fábricas cresceram na mesma proporção. Por isso, os empresários ingleses começaram a investir na instalação de indústrias.
As fábricas se espalharam rapidamente pela Inglaterra e provocaram mudanças tão profundas que os historiadores atuais chamam aquele período de Revolução Industrial. O modo de vida e a mentalidade de milhões de pessoas se transformaram, numa velocidade espantosa. O mundo novo do capitalismo, da cidade, da tecnologia e da mudança incessante triunfou.
Antiga máquina de vapor situada na Escola Técnica Superior de engenheiros Industriais de Madrid, Espanha.
A classe trabalhadora
Na estrutura socioeconômica ocidental fez-se a separação definitiva entre o capital, representado pelos donos dos meios de produção, e o trabalho, representado pelos assalariados. O trabalhador perdia a posse das ferramentas e máquinas, passando apenas da única coisa que lhe pertencia: sua força de trabalho.
A Revolução Industrial estabeleceu a definitiva supremacia burguesa na ordem econômica, acelerou o êxodo rural, o crescimento urbano e a formação da classe operária.
A Revolução Industrial alterou profundamente as condições de vida do trabalhador braçal, provocando inicialmente um intenso deslocamento da população rural para as cidades. Criando enormes concentrações urbanas; a população de Londres cresceu de 800 000 habitantes em 1780 para mais de 5 milhões em 1880, por exemplo. Durante o início da Revolução Industrial, os operários viviam em condições horríveis se comparadas às condições dos trabalhadores do século seguinte. Muitos dos trabalhadores tinham um cortiço como moradia e ficavam submetidos a jornadas de trabalho que chegavam até a 80 horas por semana. O salário era medíocre (em torno de 2.5 vezes o nível de subsistência) e tanto mulheres como crianças também trabalhavam, recebendo um salário ainda menor.
O "Progresso do Século", o empresário está de costas para o processo, ignorando as condições de trabalho, a contar seus lucros, 1835.
Cena do filme Tempos Modernos. Charles Chaplin satirizando a Revoluão Industrial. População pobre em Londres, Inglaterra no século XIX, em Gravura de Gustave Doré de 1872.
Texto e Contexto
Declaração feita por um “Oficial fiandeiro de algodão” ao público de Manchester em 1817
Treinados para trabalhar desde os seis anos de idade, das cinco da manhã até as oito ou nove da noite. (...) Sem intervalos, exceto os quarenta e cinco minutos para o jantar: se comem alguma outra coisa durante o dia, têm de fazê-lo sem parar de trabalhar. O escravo negro nas Índias Ocidentais, mesmo trabalhando sob um sol tórrido, tem provavelmente uma brisa suave que às vezes o refresca, um pedaço de terra e tempo para cultiva-lo. O escravo fiandeiro inglês não desfruta do céu aberto e das brisas. Enclausurado em fábricas de oito andares, ele não tem descanso até as máquinas pararem...
Movimentos Trabalhistas
Alguns trabalhadores, indignados com sua situação, reagiam das mais diferentes formas, das quais se destacam:
Movimento Ludista (1811-1812)
Reclamações contra as máquinas inventadas após a revolução para poupar a mão-de-obra já eram normais. Mas foi em 1811 que o estopim estourou e surgiu o movimento ludista, uma forma mais radical de protesto. O nome deriva de Ned Ludd, um dos líderes do movimento. Os luditas chamaram muita atenção pelos seus atos. Invadiram fábricas e destruíram máquinas, que, segundo os luditas, por serem mais eficientes que os homens, tiravam seus trabalhos, requerendo, contudo, duras horas de jornada de trabalho. Os manifestantes sofreram uma violenta repressão, foram condenados à prisão, à deportação e até à forca. Os luditas ficaram lembrados como "os quebradores de máquinas".
Texto e Contexto
“Nunca deporemos as Armas [até que] A Camâra dos Comuns [Parlamento Inglês] aprove uma Lei para eliminar toda a Maquinaria prejudicial à Comunidade, e revogue a que enforca Destruidores de Armações. Mas nós. Nós não pedimos mais nada – assim não dá – temos de lutar.”
(Assinado pelo General do Exército de Justiceiros, Ned Ludd. In: THOMPSON, E. P. A Formação da Classe Operária Inglesa. A força dos trabalhadores. Trad. Denise Bottmann. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987. (Coleção Oficinas da História; vol. 8. p. 98.).
Movimento Cartista (1837-1848)
Em seqüência veio o movimento "cartista", organizado pela "Associação dos Operários", que exigia melhores condições de trabalho como: particularmente a limitação de oito horas para a jornada de trabalho, a regulamentação do trabalho feminino, a extinção do trabalho infantil, a folga semanal, o salário mínimo.
Este movimento lutou ainda pelos direitos políticos, como o estabelecimento do sufrágio universal (apenas para os homens, nesta época) e extinção da exigência de propriedade para se integrar ao parlamento e o fim do voto censitário. Esse movimento se destacou por sua organização, e por sua forma de atuação, chegando a conquistar diversos direitos políticos para os trabalhadores
As "trade-unions”
Os empregados das fábricas também formaram associações denominadas trade unions, que tiveram uma evolução lenta em suas reivindicações. Na segunda metade do século XIX, as trade unions evoluíram para os sindicatos, forma de organização dos trabalhadores com um considerável nível de ideologização e organização, pois o século XIX foi um período muito fértil na produção de idéias antiliberais que serviram à luta da classe operária, seja para obtenção de conquistas na relação com o capitalismo, seja na organização do movimento revolucionário cuja meta era construir o socialismo objetivando o comunismo. O mais eficiente e principal instrumento de luta das trade unions era a greve.
De 1830 a 1929 : A Expansão pelo mundo
Após 1830, a produção industrial se descentralizou da Inglaterra e se expandiu rapidamente pelo mundo, principalmente para o noroeste europeu, e para o leste dos Estados Unidos da América. Porém, cada país se desenvolveu em um ritmo diferente baseado nas condições econômicas, sociais e culturais de cada lugar.
Na Alemanha com o resultado da Guerra Franco-prussiana em 1870, houve a Unificação Alemã que, liderada por Bismarck, impulsionou a Revolução Industrial no país que já estava ocorrendo desde 1815. Foi a partir dessa época que a produção de ferro fundido começou a aumentar de forma exponencial.
Nos Estados Unidos a industrialização começou no final do século XVIII, e foi somente após a Guerra da Secessão que todo o país se tornou industrializado. A industrialização relativamente tardia dos EUA em relação à Inglaterra pode ser explicada pelo fato de que nos EUA existia muita terra per capita, já na Inglaterra existia pouca terra per capita, assim os EUA tinham uma vantagem comparativa na agricultura em relação à Inglaterra e consequentemente demorou bastante tempo para que a indústria ficasse mais importante que a agricultura. Outro fator é que os Estados do sul eram escravagistas o que retardava a acumulação de capital, como tinham muita terra eram essencialmente agrários, impedindo a total industrialização do país que até a segunda metade do século XIX era constituído só pelos Estados da faixa leste do atual Estados Unidos.
Texto Complementar
A Revolução Industrial
A Revolução Industrial teve início na segunda metade do século XVIII na Inglaterra. (...) O Modo de Produção Capitalista pode ser caracterizado pela introdução da maquinofatura e pelas relações sociais de produção assalariada. Tais relações passaram a predominar a partir do momento em que houve a separação definitiva entre capital e trabalho, reflexo direto da industrialização.
Ao mesmo tempo em que aumentava a produtividade do trabalho, podia-se observar um extraordinário crescimento nas fileiras do proletariado, submetido a dramáticas condições de vida. O trabalho feminino e infantil passou a ser explorado intensamente.
HOBSBAWM, Eric J. As Origens da Revolução Industrial. São Paulo: Global, 1979. pp. 112-115, 121-123 e 124-125.
Luddismo
O luddismo propriamente dito, entre 1811 e 1817, esteve restrito a três áreas e profissões: o West Riding (e os aparadores de tecido), o sul de Lancashire (e os tecelões de algodão) e o distrito de malharia em bastidor centrado em Nottingham, incluindo partes de Leicestershire e Derbyshire.
Trabalhadores com longas tradições artesanais, passando por uma deterioração no seu status. Os aparadores são os que mais se aproximavam da imagem popular dos luddistas. Estavam em conflito direto contra as máquinas que tanto eles como seus patrões sabiam perfeitamente que iriam substituí-los.
Seu status se tornara instável frente às máquinas que poderiam transforma-los quase que da noite para o dia, de uma elite em “uma categoria de homens desnecessária à manufatura”.
A ameaça da carda mecânica era apenas um elemento dentro de uma reviravolta generalizada contra os grandes patrões, que vinham rompendo com os costumes dos trabalhadores e destruindo um modo de vida estabelecido.
Sob um aspecto, o luddismo pode ser visto como a coisa mais próxima a uma “revolta camponesa” de trabalhadores industriais, em vez de saquear os châteaux, atacava-se o alvo mais imediato que simbolizava sua opressão – a maquina movida a vapor.
THOMPSON, E. P. A Formação da Classe Operária Inglesa. A força dos trabalhadores. Trad. Denise Bottmann. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987. (Coleção Oficinas da História; vol. 8). pp. 88-96, 178.
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