Chega de dureza: dois soldados franceses baixam as armas e tiram cochilo perto de campo de pouso de aviões
Normalmente, o fracasso da recém-empreendida Ofensiva Nivelle no rio Aisne seria apenas mais uma derrota a ser acrescentada no caderninho de débâcles do vacilante exército francês nesta grande guerra. Desta vez, porém, a derrota parece se desdobrar em consequências não previstas pelo alto-comando militar da França. Inconformados com a disparidade entre a vitória fácil cantada pelos comandantes (que haviam garantido um tranquilo avanço de 9 quilômetros em só dois dias), e a hedionda realidade enfrentada no campo de batalha - em 12 dias, quase 100.000 baixas foram registradas, com 30.000 mortos, e o avanço foi de apenas 500 metros -, os soldados dão indícios de um princípio de motim nas fileiras gaulesas.
Extra-oficialmente, apesar da disposição em proteger a pátria de ataques inimigos, uma fatia enorme do exército, que pode chegar até a metade das cerca de 100 divisões disponíveis, garante que desobedecerá ordens e, se convocada, não se engajará em batalhas tão sangrentas quanto inúteis, sem compensação estratégica ou territorial - como boa parte das últimas contendas alimentadas pelos senhores da guerra na Europa.
Em um efeito dominó, o revés na batalha do Aisne acabou extravasando uma série de demandas dos combatentes: mais licenças, melhor alimentação, melhor tratamento para as famílias do soldados e o fim das injustiças e das carnificinas. Para aplacar essa animosidade latente, no último dia 29 de abril o primeiro-ministro Aristide Briand nomeou como chefe do Estado-Maior ninguém menos do que Philippe Pétain, herói da batalha de Verdun, oficial de linha dura mas conhecido por sua empatia com as tropas. Ele já prometeu licenças mais longas e regulares e maior treinamento às tropas.
Eles querem mais licenças: soldados preparam uma ceia de Natal no front
Cabotino - A influência de Pétain, inclusive, pode ser ainda mais estendida dentro do exército. Especula-se que, no caso de uma derrota definitiva em Aisne, já esperada por todos, o coronel Robert Nivelle, mentor da malograda ofensiva à qual empresta seu sobrenome, será destituído do cargo de comandante-em-chefe do Exército. E com razão, é bom acrescentar. Sua situação foi dificultada por seus próprios atos cabotinos: Nivelle espalhou aos quatro ventos que seu plano não apenas faria a França ganhar terreno, mas também a guerra - garantia que, é evidente, não está nem perto de cumprir. Mais discreto, razoável, ativo e astuto no trato com os militares, Pétain é o número um da lista.
A reação do exército à chegada do símbolo da resistência em Verdun ainda está por ser avaliada - o teste máximo acontecerá no próprio Aisne, em que milhares e milhares de soldados prometem abandonar nos próximos dias o Chemin des Dames, parte da Linha Hindemberg alemã, um dos objetivos dos franceses. O que está cristalino é que Pétain, por já ter cedido a algumas demandas dos insurgentes, avisou que não tolerará qualquer ato de sublevação ou rebeldia, a ser punido com força. O inimigo pode ser bem mais íntimo do que se supunha.
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