Porque o latim serve aos modernos
História do Brasil e do Mundo

Porque o latim serve aos modernos


por Luciano Cânfora

Cortesia: cotati
The Ash Wednesday Supper

Tradução: Pedro Paulo A. Funari [1].

O destino do conhecimento das línguas clássicas foi marcado pela polaridade: por um lado o prazer elitista dos detentores (os verdadeiros, quero dizer) de tais competências, e, por outro lado, a derrisão de sua ?inutilidade?. Estes altos e baixos vieram como tempestades cíclicas (as reformas de currículo escolar) nos parâmetros curriculares: as atuais discussões são apenas uma etapa de uma longa história.

Depois da ?revolução cultural européia? de 1968, a França, a Alemanha e a Inglaterra (muito mais tarde a Espanha) destronaram o latim do currículo: uns antes, outros depois. Do grego, é supérfluo falar. A Itália manteve-se como um caso à parte como o é ainda hoje, ainda que em grande medida nossa ?anomalia? seja devida à hipocrisia itálica, pela qual se finge que o ensino de línguas antigas seja efetivo, quando se sabe que quase em toda parte foi deixado de lado. Talvez mais cedo ou mais tarde alguém verificará esta realidade e a sancionará de forma explícita (mas isto não é certo).

O que surpreende é que nunca se lembre de um fenômeno, ainda que imenso e muito significativo: o fato que até o século XVIII (e mais além) o latim continuou a ser também uma das línguas dos modernos. De modernos, de Giordano Bruno a Galileo, de Kant a Pascoli, que continuaram a usá-la ao lado de outras línguas faladas. Para não falar da longa duração de um fundamento da civilização, o direito romano; para não falar da Igreja Católica no Ocidente e da Ortodoxa a Oriente, que continuaram a usar latim e grego para falar aos modernos. A discussão foi sempre focalizada na pergunta: ?para que serve hoje a literatura dos antigos, ante a riqueza de conteúdo dos modernos??, enquanto conviria levar em conta a longuíssima vitalidade das duas línguas antigas tornadas modernas entre os modernos. Nos currículos, o latim dos modernos está de todo ausente. Talvez fosse um rico nutriente para vivificar nossas escolas.


[1] Publicado no Corriere della Sera, 19/3/2005, p. 23, traduzido do original italiano por Pedro Paulo A. Funari.

[2] Università degli studi di Bari, Itália.

Revista Historia e-Historia





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