Populismo, América Latina, Venezuela, Hugo Chávez, Origem populismo, Características Populismo
História do Brasil e do Mundo

Populismo, América Latina, Venezuela, Hugo Chávez, Origem populismo, Características Populismo


O Populismo na América Latina

Atualmente, no senso comum, quando nos referimos ao conceito de populismo, a primeira impressão que se causa é a de cooptação do povo por parte dos governantes através do carisma. Isso ficou nítido quando, em 2008, nas eleições municipais de Belo Horizonte, muitas pessoas identificaram o candidato do PMDB para a prefeitura da capital mineira, Leonardo Quintão, como um candidato populista, por tentar atingir grande parte da população através de um discurso carismático, de fala simples e aparente humildade. No entanto, caracterizar um governo, candidato ou qualquer atitude política é uma tarefa árdua, pois este tipo de ideologia, aplicada na América Latina no contexto do século XX, não se resume apenas a essas práticas citadas anteriormente.
Na primeira metade do século XX, a crise do Estado-oligárquico decorrente da quebra da bolsa de Nova York em 1929 propiciou uma reorganização política em alguns países latino-americanos, havendo, em certos casos, tentativas de ruptura com a hegemonia oligárquica. “Essa crise de hegemonia, quando nenhuma fração de classe tem força suficiente para assumir o poder, oferece a possibilidade do surgimento dos regimes populistas na América Latina.” (PRADO, p. 12).
Segundo Francisco Weffot, o populismo tem como principal característica a emergência das classes populares no cenário político. Essa aproximação só foi possível após certas concessões feitas pelos líderes políticos às massas, sendo que a partir delas os chefes de Estado conseguiram grande apoio popular, equilibrando seus interesses aos interesses das massas, e cada vez mais se solidificando no poder executivo do país.

A aproximação do povo foi possível graças ao atendimento concreto de demandas como a diminuição da jornada de trabalho, as leis de proteção aos trabalhadores, férias remuneradas, a instituição de um salário mínimo e outras que compuseram as primeiras legislações trabalhistas nos dois países. Não se tratava, portanto, de manipulação das massas ou mera demagogia. (WASSERMAN, p. 1).

Como ressaltou Claudia Wasserman, este fenômeno não pode ser analisado apenas como uma tentativa de cooptação das massas por parte dos líderes políticos. Corroborando com esta idéia, Maria Lígia Prado argumenta que

o populismo não pode ser explicado basicamente pela simples aparição de um líder que, demagogicamente, carrega e dirige as massas para a direção que lhe aprouver. Há inúmeras variantes que interferem no processo histórico e o conhecimento delas é que nos pode aproximar do real. O carisma de uma Eva Perón, por exemplo, é mais um dado, que obviamente deve ser levado em conta por parte do analista, na compreensão do fenômeno populista. Mas não pode ser entendido como o fator determinante, como se as massas caíssem nos braços do primeiro demagogo que se lhes surgisse à frente. (PRADO, p. 74-5).

A maioria dos estudos que contemplam o populismo na América Latina destaca que este é um fenômeno que ocorre justamente na transição de uma sociedade rural, baseada numa economia agro-exportadora, para uma sociedade moderna, urbana, industrial. Vale lembrar que no Brasil, Getúlio Vargas assume a presidência no contexto da revolução de 1930 – justamente nesse momento de transição – adotando um discurso populista, fazendo concessões às massas e obtendo grande apoio popular, mesmo contrariando, de certa forma, os interesses da pequena burguesia. As massas populares, neste sentido, compõem a principal classe para o desenvolvimento de um governo populista.

A natureza do governo populista (que é onde se exprime mais concretamente o caráter do populismo) está na busca de uma nova combinação entre as tendências do sistema social e as determinações da dependência econômica. Nesse contexto, as massas assalariadas aparecem como um elemento político dinâmico e criador. As massas populistas (por suas ações, tanto quanto na forma pela qual são manipuladas) possibilitam a reelaboração da estrutura e atribuições do Estado. [...] O colapso das oligarquias liberais ou autoritárias constituídas no século XIX, juntamente com as crises do imperialismo europeu e norte-americano, abrem novas possibilidades à reorganização do aparelho estatal, isto é, do Estado com a sociedade nacional. Aí as massas aparecem como um elemento político importante e às vezes decisivo. (IANNI, p. 9).

O populismo também possui como característica marcante a busca de uma valorização de elementos nacionais e a adoção de uma postura antiimperialista por parte do líder político.

O populismo se apresenta também como nacionalista, na medida em que busca uma saída nacionalista (pelo menos no plano teórico e em algumas poucas medidas concretas) para as economias latino-americanas, e estabelece como inimigo primordial o imperialismo. (PRADO, p. 76).

Traçadas algumas das características sobre o conceito, nosso objetivo torna-se o de identificar, no governo de Hugo Chávez na Venezuela, atitudes que demonstre o caráter populista do presidente e outras que irão contra essa hipótese. Buscaremos sustentar nossa análise principalmente a partir das atitudes populistas do presidente Lázaro Cárdenas no México durante os anos de 1934 a 1940. Para esta análise, selecionamos algumas reportagens atuais veiculadas pelo site Folha.com [1] que traz consigo algumas informações relevantes para este trabalho. Os títulos são os seguintes: 1) Chávez afirma que não há país mais democrático que a Venezuela[2]; 2) Chávez inaugura rede de lojas do Estado em antigos supermercados Cada[3]; e Chávez intensifica retórica militar em época eleitoral[4].
Hugo Chávez já está no poder da Venezuela há onze anos e, muito provavelmente concorrerá às eleições presidenciais de 2012. Quando fora perguntado se existe em seu país uma democracia autêntica, ou seja, sendo questionado de promover uma ditadura na Venezuela, Chávez afirmou que o povo está do seu lado e que foi a partir dele que ele conseguiu se sustentar no poder por três mandatos consecutivos. "Aqui não há ditadura. Eu fui eleito três vezes. E quando os ricos me tiraram por um golpe de Estado, o povo voltou a me eleger. Sou um democrata. Tenho a legitimidade que me foi dada pela maioria do povo. O socialismo democrático." (http://www1.folha.uol.com.br/mundo/751203-chavez-afirma-que-nao-ha-pais-mais-democratico-que-a-venezuela.shtml).
Chávez utiliza-se demasiadamente deste discurso – de estar no poder graças ao povo que o apóia – para escapar de críticas feitas, principalmente, por governos social-democratas. E para manter sua legitimidade e alcançar ainda mais apoio popular, Chávez busca aproximar o Estado com o povo, além de nacionalizar empresas privadas e manifestar publicamente seu compromisso com o povo venezuelano. O presidente também se utiliza fartamente da figura de Simon Bolívar, conhecido como “libertador” da Venezuela, como uma espécie de inspiração na sua conduta política.
Ao contrário de Lázaro Cárdenas, que tinha como uma de suas propostas a de incentivar o desenvolvimento capitalista do país, Chávez vive uma luta constante contra a dita burguesia venezuelana, buscando sempre nacionalizar as empresas e fortalecer o Estado, fazendo com que este concentre os principais meios de produção em seu poder. Cabe ao Estado venezuelano a condução da economia do país.

Setores da burguesia, inconformados com o populismo de Cárdenas, faziam-lhe oposição, pressionando para que pusesse termo à sua política. Num primeiro momento, não tiveram clareza das vantagens que auferiam, pois Cárdenas, ao lado dessas medidas sociais, procurou de todas as maneiras incentivar o desenvolvimento capitalista do México. O governo populista desenvolveu um vasto programa de obras públicas, abrindo possibilidades para novos investimentos de capital, permitindo, assim, aumentar a demanda de produtos do setor privado. [...] A burguesia se fortaleceu, cresceu do ponto de vista econômico, mas não estava satisfeita com a política posta em prática pelo líder populista, demasiadamente voltada para a solução das demandas sociais de operários e camponeses. (PRADO, p. 26-7).

A segunda reportagem analisada nos informa sobre a inauguração de uma rede de supermercados estatal (Bicentenário) em substituição a outra rede (Cada), de capital francês em maioria. Chávez ainda ressalta: “o socialismo é obrigado a ser melhor que o capitalismo e é isso que estamos demonstrando.” (http://www1.folha.uol.com.br/mercado/753399-chavez-inaugura-rede-de-lojas-do-estado-em-antigos-supermercados-cada.shtml). O presidente chega inclusive a assumir sua inclinação socialista, tanto que denomina seu governo como sendo um tipo peculiar de socialismo, o “socialismo democrático.”
Esta atitude de Chávez – de nacionalização e fortalecimento do Estado – pode ser considerada de cunho populista se considerarmos algumas colocações esboçadas em outrora. Cárdenas e Perón também nacionalizaram setores da economia mexicana e argentina, respectivamente. No governo de Chávez, assim como no de Perón, há também uma grande utilização dos meios de comunicação em massa, principalmente da televisão, para legitimar as atitudes governistas e reprimir os opositores do governo.
Ao contrário de Perón, que tinha Evita como grande aliada e que transmitia grande carisma ao povo argentino, e de Getúlio Vargas que também era dotado desta virtude, Chávez não demonstra atitudes carismáticas quando em público.
Porém, assim como Perón e Cárdenas, Chávez também recebe críticas exacerbadas de seu governo por não favorecer o livre desenvolvimento do capitalismo e por ter uma inclinação maior pelas massas. Porém, ao contrário dos governantes citados anteriormente que conseguiram desenvolver e levar seus países a uma maior notoriedade no cenário mundial, nos dias atuais a Venezuela vive uma crise econômica profunda, sendo que sua moeda está em constante desvalorização e sua população possui alto índice de pobreza (24,6%[5]). No entanto, o governo de Hugo Chávez ainda tem grande aceitação nacional: 62,4%[6] da população aprovam o presidente no poder. “Pouco mais de 11 anos depois de chegar ao poder, Chávez mantém uma popularidade próxima a 50%, e as pesquisas indicam que seus seguidores manterão o controle do Parlamento nas eleições de setembro.” (http://www1.folha.uol.com.br/mundo/752942-analise-chavez-intensifica-retorica-militar-em-epoca-eleitoral.shtml).
Como já dito, Chávez utiliza o discurso de apoio das massas para se legitimar no poder. A partir disso, o presidente também realiza alterações na Constituição do país para prolongar seu mandato, que muitos acreditam ser uma ditadura. Portanto, dizer que o governo de Chávez é populista seria no mínimo confuso, pois apesar das aproximações com os governos de Perón na Argentina, Cárdenas no México, e Vargas no Brasil – no que concerne às atitudes populistas –, vivemos num outro momento histórico, não mais de rompimento com uma economia agro-exportadora, destituição de um poder estatal oligárquico ou de modernização tardia dos Estados. Podemos sim perceber algumas atitudes, como esboçadas nessa análise, mas correríamos um grande risco se considerássemos o governo chavista um regime populista.


Referências Bibliográficas

DEBERT, G.Grin. Ideologia e Populismo: Adhemar de Barros, Miguel Arraes, Carlos Lacerda, Leonel Brizola. RJ: Centro Edelstein de Pesquisas Sociais, 2008, p.14-31 (Cap. I)

IANNI, Octavio. A formação do Estado populista na América Latina. 2ª ed. RJ: Civilização Brasileira, 1991, p.7-12 (Cap. I)

LEIS, H. R. Populismo e democracia liberal na América do Sul. Revista Debates. Porto Alegre, v.2, n.2, p.25-47, jul-dez, 2008.

PRADO, M. L.. O populismo na América Latina. 7ª ed., SP: Brasiliense, 1995.

WASSERMAN, Claúdia. Vocação populista, mas não demagógica. Zero Hora, Porto Alegre 15 out. 2005.

WEFFORT, Francisco. O populismo na política brasileira. 2ª ed. RJ: Paz e Terra, 1980, p.61-78 (Cap.III)


[1] http://www.folha.com.br
[2] Publicada no dia 15 de junho de 2010. Disponível em http://www1.folha.uol.com.br/mundo/751203-chavez-afirma-que-nao-ha-pais-mais-democratico-que-a-venezuela.shtml
[3] Publicada no dia 18 de junho de 2010. Disponível em http://www1.folha.uol.com.br/mercado/753399-chavez-inaugura-rede-de-lojas-do-estado-em-antigos-supermercados-cada.shtml
[4] Publicada em 17 de junho de 2010. Disponível em http://www1.folha.uol.com.br/mundo/752942-analise-chavez-intensifica-retorica-militar-em-epoca-eleitoral.shtml
[5] Dados de agosto de 2009. Disponível em http://www.embvenezuela.org.br/sitio/pdf/cifras2010.pdf
[6] Dados de outubro de 2009. Disponível em http://www.embvenezuela.org.br/sitio/pdf/cifras2010.pdf




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