O papel dos trens na Cidade do Rio de Janeiro
História do Brasil e do Mundo

O papel dos trens na Cidade do Rio de Janeiro


Estação de Campo Grande, RJ, em 1956

Ao contrário dos bondes, que penetraram em áreas que já vinham sendo urbanizadas ou retalhados em chácaras desde a primeira metade do século, os trens foram responsáveis pela rápida transformação de freguesias que, ate então, se mantinham exclusivamente rurais.

Mapa das ferrovias do Rio de Janeiro em 1908


Em 1858 foi inaugurado o primeiro trecho da Estrada de Ferro Dom Pedro II, ligando a freguesia de Santana a Queimados (distrito do atual município de Nova Iguaçu). Nesse mesmo ano foram inauguradas as estações de Cascadura e Engenho Novo (no Rio de Janeiro) e de Maxambomba (atual distrito sede de Nova Iguaçu). Em 1859, foram inauguradas, por sua vez, as estações de São Cristóvão e Sapopemba (atual Deodoro), enquanto a de São Francisco Xavier foi aberta em 1861.

Sapobemba e Maxambomba eram, nessa época, pequenos núcleos isolados que serviam a uma população rural esparsa. Cascadura e Engenho Novo, por outro lado, eram áreas rurais que já mantinham relações constantes com as freguesias centrais, relações essas que foram bastante incrementadas a partir de 1861, quando foi inaugurado o serviço regular de trens até Cascadura,

"Custando as passagens de primeira classe 900 reis ate Engenho Novo e 1$500 ate Cascadura. Havia passagens de 2a e 3a classes que custavam, respectivamente, 600 reis e 1$500, para o Engenho Novo e Cascadura, nos carros de 28 classe, e 300 e 500 reis, nos de 39". A existência de uma linha de subúrbios até Cascadura incentivou, de imediato, a ocupação do espaço intermediário entre esta estação e o centro. Antigas olarias, curtumes, ou mesmo núcleos rurais, passaram então a se transformar em pequenos vilarejos, e a atrair pessoas em busca de uma moradia barata, resultando daí uma elevação considerável da demanda por transporte e a conseguinte necessidade de aumentar o numero de composições e de estações. Na década de 60 foram inauguradas então as estações de Riachuelo e Todos os Santos. Em 1870, por sua vez, a linha de Cascadura passou a ser servida por mais dois trens diários, inaugurando-se de fato o sistema suburbano de transporte, já que os horários dos trens passaram então a ser mais adequados as horas de entrada e saída dos locais de emprego do centro da cidade.
Como conseqüência imediata, o processo de ocupação da faixa suburbana ate Cascadura adquiriu impetuosidade ainda maior na década seguinte, levando a inauguração das estações de Engenho de Dentro, Piedade, Rocha, Derby Club, Sampaio, Quintino, Méier, Mangueira e Encantado e, já em 1890, da estação de Madureira. O processo de ocupação dos subúrbios tomou, a princípio, uma forma tipicamente linear, localizando-se as casas ao longo da ferrovia e, com maior concentração, em torno das estações.

Aos poucos, entretanto, ruas secundárias, perpendiculares a via férrea, foram sendo abertas pelos proprietários de terras ou por pequenas companhias loteadoras, dando inicio assim a um processo de crescimento radial, que se intensificaria cada vez mais com o passar dos anos. Falando sobre a freguesia de Inhaúma, assim se expressava Noronha Santos na virada do século: ?De 1889 para cd, Inhaúma começou a progredir dia a dia, edificando-se em vários pontos da vasta e populosa freguesia confortáveis prédios, que podem competir com os melhores das freguesias urbanas. Foram retalhados os terrenos das antigas fazendas que ainda existiam; bem poucos vestígios ficaram daqueles tempos em que o braço escravo era o cooperador valioso da fortuna pública e particular?

De importância fundamental para o crescimento dos subúrbios foi também a inauguração, na década de 1880, de duas novas ferrovias. Em 1883 foi aberta ao tráfego, em caráter provisório, a Estrada de Ferro Rio D'Ouro, ligando a Quinta Imperial do Caju a represa do Rio D'Ouro, na Baixada Fluminense. Atravessando as freguesias de São Cristóvão, Engenho Novo, Inhaúma e Irajá, essa ferrovia foi construída com a finalidade de transportar material para as obras de construção da nova rede de abastecimento de água da cidade do Rio de Janeiro captada nos mananciais da Serra do Mar, em Tinguá e Xerém. Por acompanhar os encanamentos que traziam a água do Rio D'Ouro até São Cristóvão, a ferrovia foi, inicialmente, utilizada apenas para os trabalhos de conservação do sistema (adutor e distribuidor). Posteriormente, passou a ter um serviço regular de passageiros, embora jamais tenha tido o mesmo papel indutor da D. Pedro II, já que seu ponto terminal era distante do centro, na Ponta do Caju.

Isto não impediu, entretanto, que pequenos núcleos se desenvolvessem ao longo de suas linhas (dentre os quais se destacam Inhaúma, Vicente de Carvalho, Irajá, Colégio, Areal (atual Coelho Neto) e Pavuna), já que se podia alcançar o centro da cidade através de baldeação para os trens da Dom Pedro II na altura de São Francisco Xavier. Embora atravessando terras mais baixas, sujeitas a inundações periódicas, próximas que estavam da orla da baia de Guanabara, a Rio de Janeiro Northern Railway Company, também chamada Estrada do Norte (futura Leopoldina Railway), teve papel indutor muito mais importante que a Rio D'Ouro. Sua primeira linha, inaugurada a 23/04/1886, entre São Francisco Xavier e Mirity (atual Duque de Caxias), interligou uma série de núcleos semi-urbanos preexistentes, (como Bonsucesso, Ramos, Olaria, Penha, Brás de Pina, Cordovil, Lucas e Vigário Geral) que, devido a grande acessibilidade ao centro proporcionada agora pela ferrovia, passaram então a se desenvolver em ritmo bastante acelerado. A esse respeito, dizia Noronha Santos: "Quatro trens de subúrbios trafegavam diariamente, antes de 1897, na única linha que existia até Mirity, com desvios em Bonsucesso, Penha e na Parada de Lucas.

O primeiro núcleo de habitantes dessa zona que mais acentuadamente prosperou foi Bonsucesso. Esta localidade e as de Ramos, Olaria e Penha, em pouco tempo - entre os anos de 1898 e 1902 - tiveram os seus terrenos divididos em lotes, organizando-se simultaneamente empresas para construção de prédios. Ramos transformou-se em empório comercial e num dos centros de maior atividade na zona da Leopoldina Railway ?

Finalmente, em 01/11/1893, foi inaugurado o primeiro trecho da Estrada de Ferro Melhoramentos do Brasil, construída pela Companhia do mesmo nome e presidida por André Gustavo Paulo de Frontin, e que, em 1903, seria incorporada a Central do Brasil, com o nome de Linha Auxiliar. Esse trecho ligava Mangueira a Sapopemba (atual Deodoro), que já integrava a rede da Central. Em 1898 foram inauguradas, por sua vez, as estações de Vieira Fazenda, Del Castilho, Magno e Barros Filho.

Já na última década do século passado estavam pois, em pleno crescimento, os principais subúrbios do Rio de Janeiro atual. Naquela época, entretanto, eles não passavam de simples núcleos dormitórios, conforme descrevia Aureliano Portugal no inicio do século XX:

"A continuidade da cidade propriamente dita e tal que, em grande parte, se torna impossível estabelecer limites entre as paróquias urbanas e as chamadas suburbanas. Todo o percurso da Estrada de Ferro Central do Brasil, até além da Estação de Cascadura, é marginado de habitações, formando, sem quebra de continuidade, inúmeras ruas, que a freqüência e a rapidez de transporte incorporam naturalmente à cidade. O mesmo se dá com relação à vasta planície servida pelas linhas suburbanas do Norte, da Melhoramentos do Brasil e da Rio D?Ouro. Esses subúrbios não têm existência própria, independente do Centro da cidade; pelo contrario, a sua vida e comum e as relações íntimas e freqüentes; e a mesma população que moureja, no centro comercial da cidade, com a que reside neste, sendo naturalmente impossível separá-las".

A ocupação dos subúrbios é exemplificada, ainda, pela movimentação de passageiros nas estações da Central do Brasil, que atingiu, no período 1886-1896 um total de quase 30 milhões de pessoas (Tabela 3.3). Este número, se é insignificante quando comparado ao total de passageiros transportados pelos bondes (estes transportaram, em um único ano - 1896 - quase 73.000.000 pessoas), já representava, entretanto, uma demanda acima da capacidade de oferta, como exemplifica Noronha Santos ao falar da crise de transportes da década de 1890

?A crise de transporte não ficou circunscrita ao bond. Nos trens de subúrbios constituía, já naquela época, verdadeiro martírio, viajar pela manhã ou à tarde. O povo acotovelava-se nas estações principais, debatendo-se em horas de maior afluência de passageiros, como se fosse um bando de lutadores ofegantes, para alcançar um lugar no trem, onde se apinhava gente de toda castas "

Ao analisar o crescimento dos subúrbios nessa época, é preciso, pois, relativizá-lo frente ao que estava ocorrendo nas áreas servidas pelos bondes. Com efeito, apesar das freguesias de Engenho Novo, Inhaúma e Irajá terem apresentado um aumento demográfico considerável no período 1872-1890, já comentada, as freguesias centrais e aquelas periféricas ao centro (onde se concentrava a população mais pobre da cidade) também apresentaram incrementos demográficos importantes. E o mesmo aconteceu com as demais freguesias urbanas, que estavam em franco processo de ocupação. Note-se, ademais, que toda a cidade começava, nessa época, a sofrer o impacto de uma industrialização incipiente, que a princípio procurou localizações próximas ao centro urbano, só se transferindo para os subúrbios no século atual.

ABREU, Maurício de A.. Evolução Urbana do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Zahar,1988.




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