Rumo ao pub: aliviados, soldados resgatados na miraculosa operação comemoram o retorno
Um milagre da libertação. Assim o primeiro-ministro britânico Winston Churchill definiu a Operação Dínamo, responsável por resgatar 338.226 homens das praias de Dunquerque, na França, em menos de uma semana. No início da operação, em 27 de maio - um dia após a rendição dos belgas -, a expectativa dos militares ocidentais era de evacuar não mais do que 50.000 soldados cercados pelo Exército alemão na costa gaulesa. Ao todo, cerca de 200 embarcações militares e 800 civis, sob fogo cerrado da Luftwaffe, participaram da empreitada, comandada pelo vice-almirante Bertram Ramsey e encerrada no dia 4.
O plano só foi possível graças à controversa decisão de Adolf Hitler de impedir o avanço de suas divisões blindadas em Dunquerque - divisões essas que estavam prestes a aniquilar o enfraquecido inimigo. "Hitler não quer correr riscos com os Panzers. Liquidar esse adversário acuado sobrou como tarefa da Força Aérea alemã", afirmou o general germânico Franz Halder, um dos maiores críticos da decisão do Führer, contestada - às escondidas, é claro - por oficiais e analistas militares do país. "Agora tudo que podemos fazer é sentar e observar milhares de inimigos escapando para a Inglaterra bem debaixo de nosso nariz", teria dito, inconformado, alguns dias depois.
A Luftwaffe conseguiu afundar seis contratorpedeiros e outras 243 embarcações; no total, as forças alemãs impingiram a perda de 60.000 combatentes aliados, entre mortos, feridos e desaparecidos. Na conta dos especialistas, porém, esse número saiu barato para os ocidentais, considerando-se que o exército francês estava enfraquecido, o exército belga havia se rendido e muitos portos do Canal já estavam sob o domínio nazista. Dos mais de 300.000 homens salvos, cerca de 118.000 foram franceses, belgas e holandeses a quem os britânicos, após a retirada de suas próprias tropas, voltaram para buscar em Dunquerque, em operações levadas a cabo pelo general Harold Alexander, da Força Expedicionária Britânica. ...
Latas de sardinha - Os relatos do front são impressionantes. O sargento Leonard Howard, que desembarcou em solo britânico em 2 de junho, conta que o embarque dos soldados envolveu muita confusão. "Eles tentaram organizar filas, mas estava muito difícil, havia muito pânico. Me lembro de que, em determinado momento, um pequeno barco chegou a Dunquerque. Tanta gente subiu a bordo que a embarcação ameaçou virar. O responsável pelo barco viu que se não tomasse uma decisão não salvaria ninguém, e então atirou em alguns homens que estavam pendurados no casco. Também vi gente correndo para o mar, gritando, porque já estavam esgotados mentalmente."
Do lado do resgate, o marinheiro-chefe Frederick Eldred, do destróier HMS Harvester, afirma que seu barco virou uma verdadeira lata de sardinha: o único lugar em que não colocou soldados foi na frente das armas. "Acredito que nunca os contratorpedeiros carregaram tanta gente como nós carregamos. Eram centenas, literalmente empilhados em todos os espaços que você possa imaginar. Em cada viagem, não sobrava lugar nem para um gato subir a bordo." Já a enfermeira Catherine Mary Butland acusou os alemães de ignorar o sinal da Cruz Vermelha e bombardear trens-ambulância. "Estávamos sendo atacados pelo ar, com metralhadoras, de todas as formas."
Apesar de celebrar o retorno de milhares de soldados, a máquina militar britânica encontra-se em situação delicadíssima em termos materiais. A Força Expedicionária Britânica deixou em Dunquerque praticamente todas as suas armas, a Marinha Real sofreu enormes baixas na frota e a Força Aérea teve nada menos do que 106 aviões abatidos. Por essas e outras, Churchill afirmou que as últimas semanas foram um "colossal desastre militar", e tratou de colocar os pés no chão, lembrando que os britânicos devem continuar lutando, agora para defender a Grã-Bretanha, próximo alvo do Reich. "Guerras não são vencidas com evacuações", afirmou.
Entretanto, como diz o general Wilhelm Keitel, chefe da OKW - o supremo comando da Wehrmacht -, cada guerra testemunha oportunidades desperdiçadas que, mais cedo ou mais tarde, se mostram fatais para seu desfecho. O "Alto!" de Hitler a seus Panzers pode ter sido uma delas.
VEJA, Junho de 1940
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