Encontrei ontem o diário da minha trisavó Joaninha, que viveu no tempo das Invasões Francesas. Como gostei da ideia, decidi também escrever um diário.
Nem sei o que hei-de escrever?
Mais um dia para esquecer! E tudo porque estamos a viver um período de guerra.
Primeiro fui à escola e o meu professor disse que devemos muito a Salazar e a Marcelo Caetano. Ora eu não concordo! Fizeram uma ditadura e querem que eu lhes deva alguma coisa?! Protestei e fui expulsa da aula.
Cheguei a casa e disseram-me que o meu irmão foi para a Guerra Colonial, que é a guerra entre Portugal Continental e as suas colónias. Comecei a chorar.
A PIDE veio buscar o meu pai. Vão levá-lo para Peniche.
Estou sozinha com a minha mãe. Com o meu avô emigrado, não há homens nesta família.
20 de Março de 1974
Encontrei na rua o meu padrinho, o capitão Salgueiro Maia, que me disse que, em breve, a liberdade vai voltar. ?Mudo de nome se isso não acontecer? disse ele.
Vamos lá ver se ele conserva o seu nome?
Estou farta!
Torturaram o meu pai! E tudo porque ele defende a liberdade que nos roubaram.
Esses tipos da PIDE metem nojo. Que chegue a liberdade!
Vou fazer anos no dia 25 de Abril. Quase de certeza que vai ser o meu pior aniversário.
Estou farta da ditadura e da guerra colonial, a vida está difícil. Queremos liberdade!
Tenho andado cansada e triste, mas não vou deixar que a ditadura me vença. ?Venham mais cinco?!
Vou lutar pela liberdade!
Passei pela sede da PIDE e ouvi uns homens a gritar. Estavam a torturá-los.
Dantes, a minha mãe dizia que havia liberdade a mais. Quero ver o que dirá agora.
10 de Abril de 1974
O meu pai chegou hoje a casa. Fugiu da prisão de Peniche, tal como fez Álvaro Cunhal. Saíram das celas, desceram a muralha e pronto! Já estavam cá fora. Acho que foi assim.
O meu padrinho contou-me porque é que me chamo Catarina. O meu nome é este por causa de uma ceifeira (Catarina Eufémia), que morreu porque também defendia a liberdade.
Honra lhe seja feita!