Bestiários
A) Figura do bestiário inesperado no Livro das Maravilhas de Mandeville. Aqui um exemplo de raças humanas muito estranhas. Segundo a descrição do autor: "besta monstruosa produzida pelo casamento do touro com asno. Tem a cabeça de um asno e corpo de homem. Parece falar, mas não é capaz de imitar a voz humana."
MAETERLINCK, L. Le Genre Satirique dans la Peinture Flamande. Gand: 1903, p. 158, fig. 124.
B) Animal com cabeça de demônio que morde o próprio rabo, que chega à boca perpassando a orelha. Seu corpo tem as vértebras aparentes.
C) Animal com cabeça humana, cabelos compridos, de quatro patas rachadas e rabo preso numa trança.
D) Animal cujas patas são membros humanos: atrás, pernas e pés; na frente, braços e mãos.
E) Animal conhecido como "Monge Marinho", com cabeça humana, cercada por um capuz de monge e corpo de um grande peixe. Figura no livro de Albert de Bollstadt, De natura animalium, com o nome de pisce monachi habitu (ver nota 1).
MAETERLINCK, L. Le Genre Satirique dans la Peinture Flamande. Gand: 1903, p. 161, fig. 133; 134; 135; 136.
Desde a época merovíngia (V - VIII d.C.), o Bestiário tomou conta do imaginário ocidental trazendo fábulas, mitologias e as teogonias mais diversas. O vocabulário bárbaro, franco, visigodo e outros tantos, também foram fontes abundantes de invenções análogas, trazendo fauna extravagante e legendária. Os primitivos desenhos de cavernas, representações de rituais totêmicos, pinturas rupestres e o imaginário religioso do Oriente, contribuíam com a maior parte dos monstros medievais mais conhecidos, tais como os dragões e as quimeras. Mas é realmente o Apocalipse de São João a fonte mais espetacular usada pelo cristianismo desde o século XI, véspera da chegada do ano mil, com todo o terror que se apostava no suposto fim do mundo. A partir daí iniciam-se as inúmeras versões a respeito das revelações de São João, e a imaginação popular se rivalizou na fertilidade de compô-las, e a arte, na força de traduzi-las, de ilustrá-las.
"O Som da Segunda Trombeta. Montanha em Chamas é lançada no mar." Apocalipse Normando, século XIV, ca 1320, Tempera e folha de ouro em pergaminho (12 ½ x 9 polegadas), The Cloisters Collection, 1968, (68.174, folio 13 recto).
Ao Apocalipse juntam-se outras passagens da Escritura, na qual bons e maus entram em ação. Satã e outros demônios que se multiplicam são mostrados em seu aspecto terrível e imundo, principalmente nas Iluminuras, miniaturas e ilustrações marginais. Assim, as visões apocalípticas não abdicam do poder que exercem sobre o espírito humano, seguindo até a Alta Idade Média, e a tradição do surreal, do fantástico, agregada à alma religiosa, só se interrompe no momento em que a devoção se faz mais íntima, mais individual e mais terna.
A mitologia das águas, vinda dos países germânicos, foi muito próspera até meados do século XVI. A mistura dos componentes desta mitologia e de outras espécies contidas no Bestiário fez com que os poetas artistas e escultores medievais inspirassem suas concepções e variassem seus protótipos.
Sereia. Escultura eclesiástica na Catedral de Bâle. CAHIER, P.CH. Nouveaux Mélanges d'Archéologie d´Histoire et de Littérature. Curiosités Mystérieuses. Paris, Librairie de Firmin in Didot Freres, fils et C: 1874, p.142, fig C.
Quanto às narrativas dos viajantes, estas se superaram em audácia na descrição dos bestiários, e pode-se dizer que até hoje é vista como uma das mais espantosas criações que o espírito humano produziu em termos de imagem durante toda a Idade Média.
A) Chest le livre de toutes les keures de la Vile d'Ypre. Sec. XIV.
A Trindade está representada por uma personagem com pernas longas e peludas, tendo na mão uma adaga e na outra um objeto redondo que parece um pequeno escudo. Sobre um pescoço desmesurado, vê-se reunidas três cabeças sob uma mesma coroa. As faces se dispõem de forma que os dois olhos da figura são vistos de perfil e um frontal. MAETERLINCK, L. Le Genre Satirique dans la Peinture Flamande. Gand: 1903, p. 65, fig. 53.
B) Bible du Musée Britannique Bibliographica. Londres, 1900, part VII, p.394.
Monge com cara de papagaio exercendo sua eloqüência diante de um bispo com o rosto de macaco que o abençoa, enquanto que ao redor deles estão seres bizarros representando, talvez, suas ovelhas. MAETERLINCK, L. Le Genre Satirique dans la Peinture Flamande. Gand: 1903, p. 141, fig. 117.
C) A figura está contida no manuscrito de Ypres intitulado "Aqui está o livro de todas as coisas da vila de Ypre". Faz forte referência à religiosidade da região. MAETERLINCK, L. Le Genre Satirique dans la Peinture Flamande. Gand: 1903, p. 146, fig. 121.
D) Na figura vemos uma ave portando sua família dentro de um cesto pendurado nas costas e seguido por uma forma monstruosa constituída de elementos bizarros e fantásticos. Manuscrit n.103 de la Bibliotèque de Cambrai. MAETERLINCK, L. Le Genre Satirique dans la Peinture Flamande. Gand: 1903, p. 75, fig. 69.